BEATO

Biografia

CARLOS DE ÁUSTRIA (1887-1922)






Oração para a Canonização do Beato Imperador Carlos da Áustria

Ó Pai celeste, através do Beato Imperador Carlos, vós destes à vossa Igreja e ao Povo de Deus um exemplo de como se pode viver uma vida de discernimento e espiritual, de maneira convincente e corajosa.

Seus atos públicos como Imperador e Rei, e suas ações como chefe de família, estavam firmemente baseados nos ensinamentos da fé católica. Seu amor pelo Senhor Eucarístico cresceu em tempos de aflição e ajudou-o a unir-se ao sacrifício de Cristo através do sacrifício de sua própria vida pelos seus povos. O Imperador Carlos honrou a Mãe de Deus e, ao longo de toda a sua vida, rezou com amorosa devoção o terço.

Quando o desânimo, a covardia, a solidão, a amargura e a depressão vierem nos abater, dai-nos força, por sua intercessão. Fazei que sigamos o exemplo do vosso fiel servo e que assistamos, desinteressadamente, aos nossos irmãos e irmãs de acordo com a vossa vontade.

Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção).

Dai ao Beato Carlos da Áustria a honra de ser canonizado, para a glória do vosso nome, o louvor da Bem-aventurada Virgem Maria e para obtermos bênçãos sobre a vossa Igreja. Amém.



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Primeiro Dia: Veneração para com o Santíssimo Sacramento

O Beato Carlos viveu sob a glória do Santíssimo Sacramento. Os raios de graça que procediam deste resplendor atraíram-no, e agradava-lhe visitar o tabernáculo. Quer cansado devido às solicitações do governo, quer como o modo usual de iniciar seu dia, ele buscava orientação e consolo diante de Jesus Cristo no tabernáculo. Em todos os lugares em que viveu, procurou ter uma capela privada onde o Santíssimo Sacramento pudesse ser conservado. Sua devoção para com a Eucaristia manifestou-se mesmo em pequenos detalhes, como na sua preocupação para que a lamparina do santuário nunca estivesse apagada. Várias vezes durante o dia, ele costumava dizer: “Preciso ir ver se a lamparina do altar ainda está queimando”. Quando dizia isso, todos sabiam que ficaria afastado por algum tempo, rezando de joelhos diante do Santíssimo Sacramento.

Sua oração e meditação eram tão profundas que, não raro, ele não percebia o que estava acontecendo ao seu redor. Por exemplo, com freqüência, ficava tão absorto em oração que não se dava conta de que a cesta da coleta estava sendo passada. Com o intuito de não perturbá-lo, a Imperatriz Zita persuadiu-o a segurar sua oferta na mão desde o início da Missa, de modo que ela poderia, assim, cutucar seu braço para que ele lançasse o dinheiro na cesta no momento oportuno.

O Padre Maurus Carnot, O.S.B., testemunhou a respeito do Imperador Carlos: “Em Disentis [Suíça], não importava se estava nevando ou se havia acúmulos de neve no caminho, era sempre pontual para a Santa Missa na Igreja de Santa Maria, onde recebia a Santa Comunhão durante as Missas em que o Príncipe Herdeiro Otto, com seus cabelos cacheados de criança, servia como coroinha...”

Durante a doença que levou o Imperador à morte, ele teve os mais fortes desejos de receber, com freqüência, a Santa Comunhão. A Santa Missa era regularmente celebrada na sala contígua ao seu quarto de enfermo. No início, a porta era deixada entreaberta, de maneira que ele pudesse assistir à Missa sem perder a privacidade ou pôr outras pessoas em risco de contágio, mas logo pediu para que a porta fosse deixada bem aberta, dizendo: “Desejo muito ver o altar!” Tinha tanto respeito para com a Eucaristia que, certa vez, ia privar-se de recebê-la por temer que seus constantes acessos de tosse viessem a profanar a hóstia. É de se notar que, durante os ritos sagrados, sua tosse cessou completamente e ele pôde comungar. Em outra ocasião, durante a Missa, ele sentiu-se impelido pelo Senhor a receber a Comunhão. Quando disse à Imperatriz Zita que comunicasse ao sacerdote que ele desejava comungar, ela lhe respondeu que isso seria impossível, pois a Condessa Mensdorff iria receber a única hóstia consagrada. Não houve meios de dissuadir o Imperador Carlos e, então, a Imperatriz Zita dirigiu-se ao sacerdote e viu que também ele deveria ter ouvido uma voz interior, pois tinha consagrado mais uma hóstia para o Imperador.

Assim como o Imperador Carlos viveu, assim também morreu. Durante a vida, ele estava unido a Nosso Senhor Eucarístico, e o Santíssimo Sacramento foi o centro de sua vida quando de sua morte. Meia hora antes de falecer, desejou receber a Santa Comunhão. Embora suas feições estivessem pálidas e macilentas devido à longa e extenuante luta contra a doença, seu rosto resplandeceu de alegria quando recebeu a Eucaristia. Este brilho permaneceu em sua fisionomia depois da morte. Nos derradeiros momentos do Imperador, o Padre Zsámboki segurou o Santíssimo Sacramento diante de seus olhos e, na presença da Eucaristia, ele pronunciou suas últimas palavras: “Seja feita a vossa vontade. Jesus, Jesus, vinde!” Com seu último suspiro, disse baixinho: “Jesus!”

Agora, ele já entrou naquela luz eterna simbolizada pela lamparina do santuário, da qual ele tão esmeradamente cuidou em sua capela.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, conforme o maravilhoso exemplo do vosso servo, o Imperador Carlos, irei visitá-lo freqüentemente no tabernáculo e recebê-lo com alegria e desejo no Santíssimo Sacramento da Eucaristia. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Segundo Dia: Um Imperador devoto do Sagrado Coração de Jesus

“Jesus, manso e humilde de Coração, fazei o meu coração semelhante ao vosso”. No dia 2 de outubro de 1918, o Beato Carlos consagrou sua pessoa e sua família ao Sagrado Coração de Jesus.

Mediante seu sofrimento por ser mal compreendido, difamado e perseguido, mediante sua disposição para sacrificar a própria vida em favor de seus povos, mediante seu exílio e, ainda, mediante a penosa doença que o conduziu à morte, o Imperador Carlos permitiu que seu coração fosse forjado em união com o Sagrado Coração de Jesus.

Mesmo no exílio e doente, ele levou muito a peito e com grande seriedade seus deveres de monarca e pai de seus povos. Em virtude de sua enfermidade, a Imperatriz Zita lia-lhe os jornais, mas percebia que os artigos excitavam-no e faziam-no preocupar-se muito. Insistiu com ele para que não lhe pedisse para fazer-lhe as leituras, pois aquilo não era bom para sua saúde. Mas, o Imperador Carlos replicou: “Estar informado é meu dever, não meu prazer. Por favor, leia!”

Sua devoção para com o Sagrado Coração de Jesus fortaleceu-o durante sua dolorosa e última doença. Em seu leito de enfermo, disse à Condessa Mensdorff: “É tão bom ter fé no Sagrado Coração de Jesus! Se não fosse isso, seria impossível suportar esses sofrimentos”.

O Beato Carlos, por toda a sua vida e também durante sua doença, trouxe, debaixo do seu travesseiro, uma imagem do Sagrado Coração de Jesus. Certa vez, quando a Imperatriz Zita quis que ele conseguisse ter um pouco do tão necessário sono, ela tirou o quadro de debaixo do travesseiro e segurou-o diante dos olhos do Imperador, dizendo-lhe que era absolutamente necessário que ele dormisse e que, portanto, deveria pedir isso ao Senhor. O Imperador fixou seus olhos na imagem e, premente, mas devotamente, disse: “Meu amado Salvador, por favor, concedei-me dormir”. Então, ele pôde adormecer e repousar por três bem necessárias horas.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, conforme o maravilhoso exemplo do vosso servo, o Imperador Carlos, também eu desejo consagrar-me ao vosso Sagrado Coração. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Terceiro Dia: Uma vida de sacrifício

“Não há maior prova de amor, que dar a vida pelo amigo”.
Na época em que o Beato Imperador Carlos foi exilado para a Ilha da Madeira, sua vida já era uma vida feita de sacrifícios pelos outros.

Ele perdera sua pátria, seu Império e seu trono. Seu próprio povo confiscou-lhe a fortuna privada e suas propriedades. Sem dinheiro, sem amigos e sem condições de ganhar a vida, tinha para sustentar a esposa, sete filhos e um outro ainda por nascer. Foi forçado a viver, sob a vigilância estrangeira, numa ilha distante, numa casa desagradavelmente úmida que não tinha condições de ser habitada. Contudo, apesar de todas essas provações, ele estava heroicamente pronto a sacrificar-se pelos outros.

O único sacrifício que ainda lhe restava fazer era o de oferecer sua vida. Por meio de suas orações, convenceu-se de que Deus desejava que ele fizesse esse sacrifício final pela salvação de seus povos.

Ao longo de toda sua existência, e durante suas tribulações, o Imperador comungava todos os dias, sempre que possível. Mesmo no final de sua vida, levou avante este costume e, em união com a hóstia sobre a patena, que se torna o Santo Sacrifício do Divino Cordeiro de Deus, ia oferecer-se completamente à vontade do Pai pela salvação de seus povos.

A igreja favorita do Imperador na Ilha da Madeira era a de Nossa Senhora do Monte, a qual podia ser avistada a milhas de distância. Certa vez, ele estava conversando com sua esposa enquanto tinham a igreja diante deles. Declarou, então, que Deus lhe pedia que desse sua vida pelo bem de seus povos. A Imperatriz, aturdida, ficou sem palavras, mas com um olhar resoluto, o Imperador fitou a igreja e disse: “Eu o farei!”

Logo depois disso, Deus aceitou o voto do Imperador. Repentinamente, ele caiu doente e sofreu uma morte precoce. As proféticas palavras pronunciadas pelo Papa São Pio X, no encontro com Carlos quando este era ainda um jovem Arquiduque, tiveram seu cumprimento: “Abençôo o Arquiduque Carlos, que será o futuro Imperador da Áustria e que ajudará a conduzir suas terras e seus povos a uma grande glória, trazendo-lhes muitas bênções. Mas, isso não será conhecido a não ser depois de sua morte”.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, agradeço-vos pelo sacrifício que o Imperador Carlos fez de sua vida. Ajudai-me a seguir seu abnegado exemplo e não vos recusar nenhum dos sacrifícios que vierdes a me pedir. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Quarto Dia: Partilhar da Paixão de Cristo – Grandeza no sofrimento

Embora o Imperador Carlos tenha sido forçado a viver no exílio e tivera que se mudar com sua família para uma casa pequena e apertada no alto de uma montanha em Funchal, ele manteve uma atitude positiva e uma alegre disposição. Àqueles que lhe perguntavam, haveria de responder: “Estamos, imerecidamente, muito bem”. Seguindo o exemplo de Cristo, ele, de boa vontade, tomou sua própria cruz pela salvação de seus povos. Ofereceu seus sofrimentos a Cristo crucificado: seu exílio; sua preocupação pelo bem-estar de sua pátria e de seus povos; sua preocupação com sua família, à qual faltavam não só comida e recursos médicos, mas que estava habitando numa casa úmida, sem aquecimento e má mobiliada.

Como Cristo suportou os escárnios dos soldados trazendo a coroa de espinhos, o manto de púrpura e a cana, assim também o Beato Carlos sofreu a zombaria de seus inimigos. Ele, trazendo os emblemas, participou misticamente da Paixão de Cristo através do sofrimento causado pela condenação proveniente de seus próprios Ministros e pelo seu exílio. Até mesmo a traição por parte daqueles que lhe eram mais próximos não lhe foi poupada.

E, no entanto, em meio a tudo isso, o Imperador Carlos podia ainda dizer: “Agradeço ao nosso amável Deus por tudo o que ele me envia”.

Como Jesus suou sangue no Horto das Oliveiras, também o Imperador Carlos sofreu terrivelmente de suores no decorrer de sua última doença. Numa crise particularmente forte, disse à Arquiduquesa Maria Teresa: “Vovó, eu lhe peço: ajude-me a não suar tanto!” Ao que ela retrucou: “Os médicos dizem que é bom para você”. O Imperador Carlos respondeu: “Mas, temo que não vou conseguir suportar isso por muito mais tempo”. Então, a Arquiduquesa apontou para o crucifixo que ele segurava em suas mãos e afirmou: “... por nós, Ele suou sangue”. Seus olhos seguiram aquele gesto. Ele fixou demoradamente o crucifixo e, em seguida, aquiesceu balançando a cabeça várias vezes. A partir daquele momento, o Beato Carlos nunca mais voltou a falar a respeito dessa sua aflição, embora continuasse a padecer com esses suores até sua morte.

Sua doença agravou-se e seus sofrimentos incluíram respiração ofegante, infecções nos braços em virtude das muitas injeções que lhe foram aplicadas, queimaduras provenientes dos emplastos de mostarda, além de outras quatro grandes queimaduras no pescoço e nos ombros onde lhe foram aplicados vesicatórios. Sua cabeça precisou ficar apoiada, pois estava muito fraco para mantê-la erguida por si só. E, apesar desses sofrimentos pessoais, ele ainda mantinha-se atento e preocupado com os outros – em especial com seus filhos – e com a possibilidade de que sua doença pudesse ser contagiosa.

Os médicos que o atendiam afirmaram que nunca tinham visto tamanha força de vontade como observaram no Imperador. Ele exerceu um notável autodomínio durante toda a sua doença, e suas capacidades mentais não se alteraram apesar das febres e da intensa dor. Notaram que, por uma única vez, o Imperador deslizou e cumprimentou-os em alemão, ao invés de usar a língua que lhes era comum: o francês.

O Beato Carlos rezou constantemente até o derradeiro instante. Os médicos, que acabaram se sentindo muito orgulhosos de seu paciente Imperial, choraram como crianças ao constatar que não poderiam evitar a sua morte ou aliviar-lhe a dor e o sofrimento. Antes de morrer, ele afirmou: “Declaro que o Manifesto de Novembro é nulo e inválido porque foi forçado. Ninguém pode negar ou anular o fato de que eu sou o Rei Coroado da Hungria”.

Às 10:00 hs da manhã, o Imperador disse: “Preciso sofrer tanto assim para que meus povos possam se unir novamente”. Então, logo depois do meio-dia, às 12:23 hs, os sofrimentos do Imperador cessaram para sempre.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, o Imperador Carlos percorreu humildemente o caminho da cruz convosco. Ajudai-me a seguir seu exemplo e, por vosso amor, carregar as cruzes do meu dia a dia. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Quinto Dia: “Amai os vossos inimigos”

O Imperador viveu heroicamente o mandamento do amor aos inimigos.
Durante toda a sua vida, ele, continuamente e de maneira exemplar, perdoou aos outros. De fato, o Imperador Carlos sofreu muito por causa de mentiras, difamações e muitas injustiças ao longo de toda a sua existência. E ainda, o último exemplo de seu perdão aos outros foram as palavras pronunciadas no seu leito de morte: “Perdôo a todos os meus inimigos, a todos os que me difamaram e a todos que trabalharam contra mim”.

Aos 5 de abril de 1925, Rodolfo Brougier, antigo ajudante de campo, escreveu suas memórias a respeito do Imperador Carlos antes de sua ascensão ao trono, em 1916: “[Ele tinha] uma autêntica fé em Deus, era de coração bom e generoso, encantadoramente agradável, incansavelmente fiel ao dever e possuía uma excepcional aptidão para a liderança militar. Sua disposição naturalmente humilde e sincera foi fortalecida por sua adequada educação. Ele não tinha ares, nem a necessidade de estar representando para o povo. Com a mais desafetada satisfação, aceitou seu pesado fardo, embora esse peso já estivesse sobrecarregando-o. A coragem do Arquiduque e a falta de medo com relação à própria segurança pessoal já eram bem conhecidas e admitidas; o desdém pelo perigo que sua pessoa poderia correr permaneceu uma de suas características como Imperador, mesmo durante os tempos difíceis”.

Por outro lado, o Beato Carlos sentia-se completamente responsável pelo bem-estar de seus súditos. “Seu comportamento de pura caridade, ao lado de sua profunda fé, constituiu a principal força motriz de sua persistente luta pela paz. Em 1916, na qualidade de Herdeiro Presuntivo, ele já considerava sua meta fundamental a obtenção de um rápido e digno fim da guerra. Desde o primeiro dia de sua ascensão ao trono, ele empenhou todos os seus esforços em favor desta meta: proteger os povos do Império de ulteriores sacrifícios e governar como um Imperador da paz sobre uma Áustria rejuvenescida”.

É difícil acreditar que um homem com tais virtudes e nobre caráter pôde ser objeto de tão amargas oposições e calúnias, de modo que a honra de seu bom nome pudesse ser destruída. O Imperador não só sofreu o confisco de suas propriedades privadas, mas também seu bom nome foi destruído por mentiras e falsidades.

A Sagrada Escritura ensina que o grau de santidade pode ser medido pela capacidade de amar o próprio inimigo. Sob a luz deste critério, podemos assegurar que o Beato Carlos atingiu um alto grau de virtude.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, vós nos ensinais no “Pai Nosso” a perdoarmos as ofensas dos outros de modo que também as nossas ofensas sejam perdoadas. Ajudai-me a imitar o exemplo do Imperador Carlos para que eu venha a perdoar todas as injustiças cometidas contra mim. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Sexto Dia: Pai dedicado

Um dos maiores sofrimentos do Imperador Carlos foi a separação de seus filhos, quando que ele e a Imperatriz Zita foram exilados para a Ilha da Madeira. As crianças permaneceram na Suíça até que a Imperatriz Zita, com muitas restrições, pôde viajar e trazê-las consigo para a Ilha da Madeira.

O texto abaixo é um relato do reencontro da família: “No dia 2 de fevereiro, [o Imperador Carlos] encontrou a Imperatriz Zita e seus filhos – exceto o Arquiduque Roberto [porque estava se recuperando de uma cirurgia de apêndice] – para acompanhá-los, bem como à Arquiduquesa Maria Teresa, até Funchal. O Imperador Carlos estava de pé no píer. A alegria das crianças era indescritível, ao cumprimentá-lo, com exuberantes abraços, quando ele subiu a bordo do navio. Lágrimas rolaram sobre a face do Imperador, enquanto carregava em seus braços o pequeno Arquiduque Rodolfo pela escada do costado. Os criados que vieram com as crianças ficaram chocados ao ver quão cansado e envelhecido tinha se tornado o seu soberano. Mas era impossível ver algum sinal de amargura em seu rosto ou ouvi-lo dizer qualquer palavra ríspida”.

Durante a doença que o conduziu à morte, o Imperador sentia grande prazer quando podia escutar, de seu leito de enfermo, as vozes de seus filhos através da janela, e se, quando os chamava em alta voz, eles conseguiam ouvi-lo.

No transcorrer de sua fatal doença, mostrou-se atencioso e preocupado pelo bem-estar dos outros e de seus filhos, devido ao perigo de contágio e ao trauma por vê-lo assim tão enfermo. De todos eles, apenas o Arquiduque Otto, na qualidade de seu Herdeiro, foi chamado ao seu leito de morte, pois ele desejava dar ao jovem Arquiduque o exemplo de como um monarca e um católico depara-se com a morte. Como Otto chorasse soluçando ao ver seu pai lutando com a morte, ele foi confortado por sua mãe. O Imperador quis poupar às demais crianças o contágio e traumas.

Uma das últimas orações que o Imperador pronunciou pouco antes de morrer foi por todos os seus filhos, os quais mencionou por nome, colocando-os sob a especial proteção do Senhor. A Arquiduquesa Maria Teresa ouviu, por acaso, o Imperador rezando por eles e dá o seguinte relato: “‘Meu amado Salvador, protegei os nossos filhos: Otto, Mädi, Roberto, Felix, Carlos Luís... Quem, mesmo, vem depois?’ A Imperatriz o ajudou: ‘Rodolfo’. ‘Rodolfo, Lotti e, especialmente, o mais novo pequenino [a Imperatriz estava esperando a Arquiduquesa Elisabete, que nasceu depois da morte do Imperador]. Preservai-os no corpo e na alma, e deixai-os antes morrer que cometer um pecado mortal. Amém. Seja feita a vossa vontade. Amém’”.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, eu vos agradeço pelo Beato Carlos ter amado sua família e a ter confiado à vossa vontade e ao vosso plano divino, que ele tanto prezava. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Sétimo Dia: O Soberano

Testemunhas louvam o profundo senso de dever do Beato Carlos. Concebia o cargo de Imperador a ele confiado como uma missão sagrada e via-se a si mesmo como um pai para seus povos. Durante uma conversa com o Conde Polzer-Hoditz, aos 28 de abril de 1917, o Imperador disse: “No entanto, tudo se resume simplesmente em ajudar tanto quanto se pode ajudar. Como Imperador, devo dar o bom exemplo. Se todos apenas praticassem seus deveres de cristão, não haveria tanto ódio e miséria no mundo”. Seu amor pelo próximo foi exemplar. Para aliviar o sofrimento de seu povo esgotado pela guerra, o Imperador Carlos ordenou que os cavalos e carroças do palácio fossem colocados a serviço da entrega de carvão à população vienense; doou grande parte de sua fortuna particular; e até mesmo deu roupas de seu próprio uso para os necessitados.

Em 1914, no início a guerra, o futuro Imperador declarou para uma multidão que se reunira, à frente do Palácio de Hetzendorff, apoiando a guerra: “Todos aqueles que me conhecem, sabem como eu amo a Áustria e a Hungria. Não posso recuar no momento de sua necessidade. Todos aqueles que me conhecem sabem também o quanto eu sou um soldado e como fui treinado para situações de guerra. Contudo, eu simplesmente não posso entender como as pessoas podem acolher a esta guerra – ainda que justa – com tanto júbilo. A guerra, afinal, é algo pavoroso”. Em 1938, o Dr. Friedrich Funder escreveu a respeito do Imperador Carlos: “Ele foi o único Chefe de Estado que buscou incessantemente os meios para terminar a guerra... e fez isso usando todo o seu ser, com amigos e inimigos. Se as circunstâncias tivessem corrido segundo o desejo e os esforços do Imperador Carlos, milhões de vidas perdidas nas batalhas – e não só austríacas – teriam sido poupadas, a terrível degradação do povo alemão teria sido evitada e a Europa teria gozado de uma paz duradoura até os nossos dias”.

O Imperador Carlos tinha a mais íntima convicção de que Deus lhe havia confiado a coroa e, por causa desta certeza, a coroação real na Hungria teve um grande significado para ele. Passados cinqüenta anos deste acontecimento, a Imperatriz Zita referiu-se assim à coroação: “Aquilo que mais nos impressionou em toda a cerimônia foi o tocante lado litúrgico que a perpassava – em especial, os juramentos que o Rei pronunciou, diante do altar, antes de sua unção, de preservar a justiça para todos e de lutar pela paz. Este sagrado compromisso imputado na catedral era exatamente o programa político que ele gostaria de levar avante a partir do trono. Ambos sentimos isso de modo tão forte que quase nenhuma palavra foi necessária entre nós”. (Excerto de: Gordon Brook-Shepherd: The Last Habsburg, Weybright and Talley, New York, 1968)

O rito da coroação é descrito pela Dr.ª Maria Holbacher: “Mediante o rito sagrado, o qual é liturgicamente conferido ‘pela graça de Deus’ como um sacramental, ele se torna soberano e fica impregnado da graça divina para assumir o específico posto de sua alta vocação, de modo que venha a governar os povos a ele confiados na paz e prosperidade, para a salvação deles. A cerimônia da coroação se dá antes do ofertório da Santa Missa e é semelhante à Profissão Solene, à Ordenação Sacerdotal, à Benção dos Abades e à Consagração dos Bispos, nas quais o candidato prostra-se no chão diante do altar, enquanto se reza a Ladainha de todos os santos. O Primaz da Hungria, Arcebispo de Esztergom, preside o rito da coroação e celebra a Missa. Depois de uma longa oração, durante a qual o candidato à coroação permanece em pé, ele é ungido com o sagrado crisma e investido com os emblemas e insígnias reais, enquanto cada uma de suas sagradas obrigações é citada individualmente. O procedimento é esse para que o candidato compreenda claramente que as normas e expectativas das obrigações éticas e das ações morais são tão altas que a capacidade humana sozinha é incapaz de realizá-las sem o auxílio divino”.

A fidelidade do Beato Carlos como monarca ungido é distintiva. Ele preferiu ser mal julgado, difamado, exilado e reduzido à completa pobreza a ser desleal ao juramento de sua coroação. Estava pessoalmente convicto de que nunca haveria de abdicar, pois tinha recebido, de modo irrevogável, a coroa das mãos de Deus, através dos representantes da Igreja.

O Padre Maurus Carnot, O.S.B., que assistia pastoralmente o Imperador Carlos quando de seu exílio na Suíça, ouviu-o declarar com determinação: “Mas, eu jamais renunciarei o juramento de minha coroação. A Coroa de Santo Estêvão é sagrada para mim. Podem tirar-me a vida, mas nunca, nunca, nunca poderão tirar meu juramento e a santa Coroa”.

A Imperatriz Zita seguiu o exemplo de seu marido por toda a sua vida e permaneceu firme em sua recusa a abdicar.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, eu vos agradeço pela fidelidade do Imperador Carlos à sua vocação. Ajudai-me para que também eu possa cumprir fielmente minhas responsabilidades. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Oitavo Dia: Fiel cumprimento da vontade de Deus

O Imperador Carlos procurou a vontade de Deus em tudo quanto fez. Para ele, esta era a regra mais importante de sua vida e de suas ações. Testemunhas falam também de seu amor pela castidade e de sua absoluta recusa em tolerar uma linguagem indecente na sua presença.

Em seu leito de morte, disse à Imperatriz Zita: “‘Zangar-se? Lamentar-se? Quando se conhece a vontade de Deus, tudo está bem’. E, pouco depois: ‘Agora, quero dizer-lhe com absoluta franqueza como se dá comigo: Todo o meu empenho sempre foi reconhecer claramente, em tudo, a vontade de Deus e segui-la da maneira mais perfeita’. E depois de algum tempo, repetiu: ‘Apenas não nos lamentemos’”.

A frase “Seja feita a vossa vontade!” foi um princípio orientador na vida do Beato Carlos e ele a repetiu pouco antes de depor sua alma nas mãos do Criador. Com Cristo, o Imperador Carlos podia dizer: “Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou”. Tinha recebido a incumbência de dirigir seus povos como regente de Deus, e como tal, este nobre monarca subordinou-se e deu-se a si mesmo em humilde serviço. Estava preparado para o Céu, e esta foi a razão pela qual o Senhor o pôde chamar para junto de si.

Para ele, os outros sempre estavam na frente; ele sempre vinha por último. Sob este aspecto, o Imperador Carlos é um bom exemplo de um homem devoto da Virgem Maria, que deu o seu “Fiat” e disse: “Faça-se em mim segundo a vossa palavra”. Sua alma pura espelhava o “Fiat” da Mãe de Deus.

Mesmo na sua última doença e num delírio febril, ele só pensava em cumprir suas obrigações: “Ora, [estava preocupado] com as crianças vienenses para as quais tentava conseguir leite; ora, com um soldado checo internado num hospital militar e que ardia em sede. E estava sempre atormentado com a negligenciada evacuação da Transilvânia antes da invasão romena, assunto que fora causa de violentas batalhas verbais entre ele e o Conde Tisza”. O I

mperador Carlos seguiu o exemplo de seu Senhor e Salvador, que sofreu sozinho no Horto das Oliveiras, e em meio às suas maiores provações, bebeu com Cristo o cálice do sofrimento. Aceitou a vontade de seu Pai em suas grandíssimas aflições – as quais, todas, excederam os padrões da normalidade – e, ainda, apesar de tudo isso, o Beato Carlos podia dizer: “Agradeço ao nosso amável Deus por tudo o que ele me envia”.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, eu vos agradeço pelo “Fiat” do Imperador Carlos em todas as situações de sua vida. Ajudai-me a reconhecer a vossa vontade em minha vida e a segui-la. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.

Nono Dia: A Bem-aventurada Virgem Maria

No dia de seu falecimento, o Imperador perguntou à sua esposa que dia era aquele. “O dia da Mãe do Senhor”, respondeu a Imperatriz. “Então, sábado”, ele confirmou contente. Depois de sua morte, o corpo do Imperador Carlos foi colocado na igreja mariana de Nossa Senhora do Monte, na Ilha da Madeira, onde jaz ainda hoje.

Por toda a sua vida, o manto protetor de Maria envolveu o Imperador Carlos, como se pode perceber nos acontecimentos mais relevantes de sua existência. “O dia 19 de novembro [dia de sua chegada na Ilha da Madeira] era um sábado. Muitas das datas mais importantes da vida do Imperador se deram em sábados. Ele foi crismado num sábado; atingiu sua maioridade e casou-se em dias de sábado; foi coroado Rei da Hungria num sábado. Foi também num sábado que o Rei retornou à pátria húngara em sua primeira tentativa de restaurar a monarquia, e foi num sábado depois que a segunda tentativa de restauração húngara tinha fracassado que ele se negou, com terríveis conseqüências, a renunciar a todos os direitos ao trono. Foi num fatídico sábado que a família mudou-se para a brumosa atmosfera do Monte; e o último dia da vida do Imperador, 1º de abril de 1922 – quando Deus chamou seu fiel servo de volta à casa –, era um sábado”.

Com o terço nas mãos, o Imperador Carlos combateu espiritualmente as batalhas de sua vida. É exemplar o fato de que ele rezava o terço, fielmente, todos os dias. Sim, as contas do terço, que ele recebeu do Papa São Pio X, haveriam de deslizar por entre seus dedos quando ele rezava suas orações quotidianas. Negócios de governo poderiam estar urgentemente exigindo sua atenção, contudo, o Imperador ainda arranjava tempo, de modo que tivesse para si ao menos meia hora para rezar o terço.

Como fiel filho de Maria, ele honrou sua Mãe do céu imitando-a. Modéstia, humildade e uma natureza aberta, amiga e cativante foram algumas das virtudes que ele cultivou dentro de si. Estima da vontade de Deus, devoção a uma profunda vida de oração e devoções marianas eram normas fundamentais em sua vida. Como um amável monarca e pai, ele permitiu que seu coração fosse transpassado por uma espada de dor, tal como o coração da Bem-aventurada Mãe foi transpassado quando ela estava de pé junto à cruz de seu Filho.

Oração:
Meu Senhor e meu Deus, eu vos agradeço pelos maternais cuidados de Maria na vida do Imperador Carlos. Ajudai-me para que eu possa seguir fiel e devotamente o seu exemplo e reze o terço todos os dias. Ouvi minhas súplicas e atendei o meu pedido (menciona-se, aqui, a intenção) por intercessão do Beato Imperador Carlos da Áustria.



Liga de Oração do Imperador Carlos para a Paz dos Povos 
(Kaiser Karl – Gebetsliga für den Völkerfrieden)

Quando o Beato Carlos tinha apenas oito anos, Madre Vinzentia, uma estigmatizada do convento das Ursulinas em Sopron, Hungria, aconselhou “que o jovem Arquiduque fosse envolvido em orações, pois haveria de se tornar Imperador, sofrer muito e ser um alvo do Inferno”. A partir de então, um pequeno grupo começou a rezar por ele e por suas intenções. A importância desta previsão e a necessidade de orações manifestaram-se por si sós em sua vida de sofrimentos, exílio e morte precoce. A Providência Divina, contudo, permitiu que agora as virtudes do Beato Carlos estejam se tornando conhecidas para revelar sua verdadeira personalidade, livre das mentiras da propaganda e das calúnias. A começar de sua santa morte, e prosseguindo até os dias atuais, pessoas que sofrem e estão oprimidas buscam auxílio junto dele, e muitas orações têm sido atendidas através de sua intercessão.

Dado que o Imperador Carlos tentou constantemente realizar a paz durante seu breve reinado, ele é, sem dúvida, um poderoso intercessor pela paz no mundo de hoje. O pequeno grupo inspirado por Madre Vinzentia tornou-se a Liga de Oração e espalhou-se por vários países em todo o mundo.

No 50º aniversário da morte do Imperador, em 1º de abril de 1972, uma comissão eclesiástica e membros de sua família abriram seu túmulo. Seu corpo foi encontrado incorrupto e, desde então, a Causa de Beatificação e Canonização do Imperador Carlos tem sido levada avante.

Aos 12 de abril de 2003, o Papa João Paulo II proclamou as virtudes heróicas do Imperador Carlos e concedeu-lhe o título de Venerável. No decreto de promulgação, afirma-se: “Ele foi um homem de incontestável integridade moral e sólida fé, que sempre tentou fazer o melhor para os seus povos e que, nos atos de seu governo, conformou-se à doutrina social da Igreja. Promoveu a justiça e a paz com o constante desejo da santidade. Foi um cristão, esposo pai e monarca exemplar”.

Aos 20 de dezembro de 2003, um milagre atribuído ao então Venerável Carlos foi aprovado pelo Papa João Paulo II, abrindo o caminho para a cerimônia de beatificação. O milagre está relacionado com uma Irmã polonesa encarregada de um grande hospital no Brasil. Na década de 60, ela teve sérios problemas com suas pernas e ficou acamada, sem poder andar. Depois de várias operações sem sucesso, suas pernas ainda não tinham sido curadas. Infeccionaram-se e tornaram-se uma constante fonte de dores. Quando outra Irmã lhe sugeriu para rezar para o Imperador Carlos, ela refutou tal sugestão, preferindo um santo mais familiar e popular. No entanto, as dores e a infecção só aumentavam e surgiu a possibilidade de uma amputação. Finalmente, desesperada, a Irmã rezou para o Imperador Carlos. No dia seguinte, ela estava completamente curada. Em virtude do trabalho exercido pela Irmã e das numerosas operações, seu caso está bem documentado por vários médicos e enfermeiras.

Aos 3 de outubro de 2004, o Papa João Paulo II beatificou o Imperador Carlos da Áustria na Praça de São Pedro.

Os membros da Liga de Oração procuram seguir o exemplo do Beato Imperador Carlos:

buscando e cumprindo a vontade de Deus em sua vida quotidiana;
trabalhando pela paz e a justiça em todos os âmbitos da vida, desde a família até a comunidade inteira;
pedindo perdão e oferecendo, em caráter vicarial, atos de expiação a Deus por todas as injustiças cometidas ao longo da história, i.e., não deixando Cristo sozinho no Horto das Oliveiras e no Gólgota, mas antes carregando com ele o fardo dos outros mediante a oração, o serviço ao próximo e o sacrifício.
Com isto em mente, comprometem-se a:

rezar a oração da Liga todos os dias;
oferecer, ao menos uma vez ao mês, a intenção da Santa Missa de acordo com seu estado de vida;
participar, sempre que possível, da peregrinação anual da paz, das Missas, dos exercícios espirituais, conferências e outros eventos da Liga de Oração;
promover a Causa de Canonização do Beato Imperador Carlos.
Deus todo-poderoso,
vós chamastes, desde toda eternidade, o Beato Carlos à dignidade de ser o soberano e pai de muitas nações, e o escolhestes para trilhar o real caminho da cruz. Nós vos pedimos humildemente que lhe seja concedida a honra de ser canonizado e que, seguindo o exemplo de suas virtudes, obtenhamos a graça de tornar nossos corações sempre mais semelhantes ao Sagrado Coração do vosso dileto Filho. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.


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Carlos de Habsburgo imperador da Áustria e rei da Hungria. O último imperador católico

Foram reconhecidas as virtudes heróicas de Carlos de Habsburgo imperador da Áustria e rei da Hungria. Reinou nos anos da Primeira Grande Guerra, “o massacre inútil” que Carlos procurou deter sem sucesso. E que levaria ao ocaso definitivo do que restava do Sacrum Imperium

de Paolo Mattei

O imperador Carlos I, da Áustria, no dia da coroação como rei apostólico da Hungria; a sua esquerda, a imperatriz Zita e o príncipe herdeiro Otão
O imperador Carlos I, da Áustria, no dia da coroação como rei apostólico da Hungria; a sua esquerda, a imperatriz Zita e o príncipe herdeiro Otão
É um dia de primavera de 1922 em Funchal, na ilha da Madeira. Na catedral de Nossa Senhora do Monte, 30 mil pessoas assistem ao funeral de um rei de trinta e quatro anos. O homem, que foi imperador em meio aos primeiros destroços fumegantes do século XX, morreu pobre e exilado nesta ilha, nos braços de sua mulher, a imperatriz, em 1� de abril desse ano. A multidão que se aglomera dentro e fora da igreja e a maior parte dos habitantes da ilha o consideram um santo. Seu nome é Carlos, Carlos I, imperador da Áustria e rei da Hungria. Nas últimas horas, perguntava brincando aos médicos que tentavam em vão curar sua grave pneumonia: "Comment allez-vous? Moi je vais bien!".
O hóspede ilustre da ilha tem o rosto sereno, e as pessoas vão até lá para cumprimentar pela uma última vez o homem que durante cinco meses deu conforto a suas vidas com a sua presença. O bispo de Funchal dirá a um padre austríaco, algum tempo depois: "Nenhuma missão concorreu tão eficazmente para reavivar a fé na minha diocese quanto o exemplo dado por seu imperador em sua enfermidade e em sua morte".
No último mês de abril, oitenta e um anos depois daquele dia de primavera, foram reconhecidas suas "virtudes heróicas", primeiro passo no caminho para a beatificação.
Na noite anterior à sua morte, Carlos sussurrara à mulher: "Toda a minha aspiração é conhecer sempre, o mais claramente possível e em todas as coisas, a vontade de Deus, e segui-la, e da maneira mais perfeita". Era a aspiração que o havia acompanhado durante todos os dias de sua vida.

A carreira de um imperador
Nascido em Persenbeug, às margens do rio Danúbio, na Baixa Áustria, em 17 de agosto de 1887, Carlos era o primogênito do arquiduque da Áustria, Otão Francisco - sobrinho de sua alteza imperial e real Francisco José -, e da arquiduquesa Maria Josefa, que nasceu princesa e duquesa da Saxônia. Como todo rebento de sua estirpe, foi conduzido a aprender as várias línguas faladas no Império, a estudar música, a cursar o ginásio e o colegial na abadia beneditina dos "Schotten", em Viena, e a formar-se em Ciências Jurídicas na universidade de Praga. Em 1911, desposou Zita, dos Bourbon de Parma. O matrimônio foi abençoado pelo papa Pio X, o qual, em audiência privada a Zita, preconizou o futuro de seu consorte como imperador e revelou a ela que as virtudes cristãs de Carlos seriam um exemplo para todos os povos. Do casamento nasceram 8 filhos, o último dos quais veio à luz depois da morte de Carlos.
A carreira militar começou em 1903 e terminou em 1916, quando subiu ao trono. Carlos se tornara príncipe herdeiro quando morreu seu tio, Francisco Ferdinando, cujo homicídio, estopim da Grande Guerra, consumou-se em 28 de junho de 1914. Pio X, logo depois do assassinato do arquiduque em Sarajevo, enviou uma carta a Carlos por intermédio de um alto funcionário vaticano, na qual lhe rogava que alertasse Francisco José sobre o perigo de uma guerra que traria enorme desventura à Áustria e a toda a Europa. Mas o conteúdo da carta veio a ser conhecido por aqueles que lutavam pelo início da guerra, e o funcionário vaticano foi detido na fronteira da Itália. Carlos só recebeu a carta muito tempo depois, em pleno conflito, quando já era tarde demais para procurar afastá-lo.
Dois anos depois do início das hostilidades, quando morreu o tio-avô Francisco José, Carlos se tornou imperador com o nome de Carlos I: era 21 de novembro de 1916. Em 30 de dezembro, na igreja de Santo Estêvão, catedral de Budapeste, foi coroado rei apostólico da Hungria, com o nome de Carlos IV: a monarquia dual austro-húngara formara-se em 1867, quando, com o reconhecimento da autonomia húngara, os territórios do Império foram divididos em dois blocos: a Cisleithania, sob administração austríaca, e a Transleithania, sob administração húngara. As Constituições, os governos e os primeiros-ministros eram distintos, mas as duas partes conservavam em comum o imperador - imperador da Áustria e rei da Hungria - e os ministérios das Relações Exteriores, da Fazenda e da Guerra.
Carlos herdava uma potência em crise e em declínio: a Áustria-Hungria já sofria com a expansão da Alemanha e as derrotas sofridas nos lados da Itália ao longo das guerras de independência, e agora via seus territórios balcânicos também ameaçados. Além de tudo, depois das primeiras batalhas vitoriosas, as tropas imperiais estavam arrasadas. Se, no que diz respeito ao início do conflito, é verdade o que anota o historiador Victor Tapié (Monarchie et peuples du Danube. Paris, Fayard, 1969), quando afirma que "o exército austro-húngaro bateu-se com uma energia constante e que, qualquer que fosse sua origem étnica, o soldado, atado por um sentimento de fidelidade pessoal e bem refletido, deu provas de resistência e coragem", é também verdade que, já no final de 1915, o cansaço e as perdas de vidas humanas quase prevaleciam. Metade do exército regular - mal equipado, tecnologicamente atrasado, insuficientemente financiado - foi eliminada já nos combates de 1914. Os destinos da guerra para os austro-húngaros dependiam inteiramente da força dos aliados alemães.
Carlos chegou ao front em 10 de setembro de 1914, na Galícia, e pediu logo para visitar, em nome do imperador, as tropas na linha de frente. Ia encontrar os soldados em todos os setores das vários frentes, condecorava os oficiais por seus méritos e fornecia a Francisco José relatórios não falseados da situação militar, sem lhe esconder que o conflito, com o passar dos meses, ia-se transformando numa carnificina sem precedentes. A infantaria era enviada ao suicídio, seguindo a tática louca dos ataques frontais com baionetas. Carlos assumiu o comando da 20� Corporação em 1916, ano dos massacres de Verdum, do Somme e das nove primeiras batalhas do Isonzo; ano também do aparecimento dos tanques de guerra ingleses nos campos de batalha. Sua ação foi decisiva para derrotar a Romênia e deter o avanço dos russos comandados pelo general Brusilov na frente oriental. Empreendeu a ofensiva na frente italiana que culminou com a vitória de Folgaria. Mas as ruínas e o extermínio desses combates vitoriosos eram insuportáveis para ele. Suas tentativas de iniciar negociações de paz começaram bem no momento em que a Dupla Aliança austro-alemã conseguia as conquistas mais significativas. Falando ao ministro das Relações Exteriores austríaco, conde Berchtold, disse-lhe não entender como era possível continuar "a não fazer ainda nenhum programa pela paz. Quer vençamos, com a graça de Deus, quer sejamos derrotados, é preciso de qualquer forma fixar esse programa com os diversos aliados. Eu não posso e não quero ser pessimista". Desde então, para encontrar uma solução pacífica para aquela guerra trágica, o futuro imperador não fez outra coisa senão percorrer todas as estradas diplomáticas possíveis. Ao mesmo tempo que continuava a percorrer também as estradas de verdade, que se abriam com dificuldade entre as trincheiras da linha de frente.
Na Positio super virtutibus estão reunidos os testemunhos sobre pequenos episódios que aconteceram naqueles anos. Neles se lê que Carlos "gastou completamente, rezando, o rosário de contas de ouro que sempre carregava consigo, de modo que depois a jovem arquiduquesa teve de providenciar um novo". Conta-se o dia em que salvou a vida de um subordinado que estava para se afogar no Isonzo. Registra-se o depoimento do capelão Rodolfo Spitzl, que, na estrada que vai do vale do Ástico a Arsiero, durante uma marcha forçada da tropa, viu o futuro imperador cuidar pessoalmente de um soldado que, por suas feridas, não conseguia mais caminhar: "Eu não acredito", disse então Carlos ao oficial médico, "que o senhor ou eu conseguiríamos marchar com os pés desse jeito tanto tempo quanto este homem. Providencie o mais rápido possível que ele vá convalescer num hospital". Padre Spitzl conta como o viu tranqüilizado quando soube "que no regimento se dava pouca importância às ‘celebrações religiosas nas paradas’, e que se procurava em primeiro lugar providenciar ao menos uma vez por mês que cada subdivisão - mesmo nas áreas de combate - tivesse a oportunidade de assistir à santa missa e receber os santos sacramentos". São esses pequenos episódios que dão também uma idéia da fé de Carlos. E do caráter firme com que se fazia obedecer. Por exemplo, quando se opôs ao uso de gases letais contra o inimigo, contestando a ordem do chefe de Estado Maior alemão Hans von Seeckt, que queria empregá-los na frente oriental. Ou quando lutou contra a utilização dos submarinos para atacar as cidades inimigas na orla do Adriático, a começar por Veneza.

Da "guerra de forças"
à "guerra metafísica"
Como imperador, Carlos assumiu automaticamente o comando supremo de todas as tropas. Uma de suas primeiras decisões foi transferir a sede do comando supremo, de Teschen para Baden, perto de Viena, de forma que tivesse mais facilidade para exercer os encargos políticos e militares. Mas acabou passando mais dias no front que em Baden, pois participava da vida das tropas, indo constantemente à linha de frente para inspeções. Recebia relatórios diretos de todos os comandantes, que conhecia pessoalmente. Ficou muitas vezes à mercê das shrapnel, as balas de canhão explosivas que liberavam uma chuva de estilhaços nos campos de batalha. E entre 1916 e 1918 foi ainda mais obstinado na tentativa de fazer cessar a hostilidade, tanto que os alemães o acusaram de covardia, pois só reconheciam a "paz vitoriosa". Para pôr em prática sua política, Carlos nomeou novos ministros, escolhendo-os entre aqueles que não haviam tramado para favorecer a guerra.
O imperador também sabia que a paz social de seu país era condição fundamental e necessária para se alcançar a paz mundial. Por isso, instituiu um Ministério para a Assistência Social e um para a Saúde Pública, aboliu a prática dos duelos e concedeu uma anistia geral em 1917. Os nacionalismos que inflamavam o Reino também punham em risco a paz interna, e afastavam a internacional. Foi por isso que Carlos projetou um Estado com base federativa, segundo o propósito de Francisco Ferdinando. François Fejtó, no livro Requiem pour un empire défunt (Paris, Le Seuil, 1993), explica que, seguindo o que Francisco Ferdinando imaginara, Carlos "queria eliminar da Constituição húngara tudo o que pudesse impedir eventuais concessões aos sérvios e tentativas de mudar a estrutura dual do império. Propunha-s_ também a dar satisfações aos autonomistas tchecos, que, como outros eslavos e, em geral, todas as forças pacifistas da monarquia - particularmente os socialistas -, tinham-se encorajado com os sinais precursores da revolução russa de fevereiro de 1917". Mas a perspectiva federativa, que trazia consigo o sufrágio universal, não podia agradar à aristocracia que ocupava o poder na Hungria. Leo Valiani, no livro La dissoluzione dell’Austria-Ungheria (Milão, Il Saggiatore, 1966), explica que as "reformas democráticas, que deveriam salvar a monarquia de se esfacelar, no caso de uma paz que viesse de alguma forma da derrota militar, eram alvo a priori da oposição tanto da maioria do Parlamento húngaro quanto dos partidos austro-alemães do Reichsrat, com exceção apenas dos social-democratas".
Na esfera internacional, Carlos via nas relações com a França a possibilidade mais concreta para chegar a um acordo pela paz. Assim, escreveu ao presidente da República francesa, Poincaré, em 24 de março de 1917, numa carta secreta: "Fico particularmente feliz por constatar que, mesmo nos encontrando atualmente em campos opostos, nenhuma diferença fundamental de perspectiva ou aspiração divide meu Império da França. Creio ter o direito de esperar que a viva simpatia que alimento pela França, sustentada pelo afeto que ela inspira em toda a monarquia, impeça para sempre a volta a um estado de guerra, pelo que emprego toda a minha responsabilidade pessoal". Graças a essa proximidade, em 1917 o príncipe Sixto de Bourbon - cunhado de Carlos, descendente dos reis franceses, condecorado por Poincaré com a cruz do mérito na guerra - começou, com Carlos, uma negociação diplomática entre a França e o Império. Negociação que deveria ser mantida em segredo, para não despertar suspeitas entre os alemães. Carlos, naturalmente, desejava conquistar a paz ao lado da Alemanha, mas não excluía a possibilidade de que, não aceitando o Kaiser uma eventual saída positiva do conflito (cuja condicio sine qua non era a restituição da Alsácia-Lorena à França e a libertação dos países invadidos), a Áustria se desligasse da Aliança e assinasse a paz separadamente. Essas negociações fracassaram, não só pela dificuldade de se chegar a um acordo definitivo sobre os territórios reivindicados pela Itália, mas sobretudo também pela postura irresponsável do ministro das Relações Exteriores austríaco, Ottokar Czernin. O historiador Gordon Brook-Shepherd, no livro The Last Habsburg (Nova York, Weybright & Talley, 1968), vê na nomeação do ministro das Relações Exteriores um erro fundamental cometido por Carlos, pois Czernin nunca buscou a paz, e era um amigo incondicional dos alemães, que desejavam que a guerra só terminasse depois de sua vitória total. Czernin, em 1918, fez com que o primeiro-ministro francês, Clemenceau, revelasse ao mundo a negociação secreta do Imperador pela paz separada, pondo em risco, assim, a vida de Carlos e a segurança da Áustria perante a Alemanha. Carlos foi obrigado a recuar publicamente. Era a vitória daqueles que, explica Fejtó, "estavam obcecados por uma vitória total [...]. Ao longo da guerra - que emperrou várias vezes, em impasses dos quais tradicionalmente se sairia por meio de negociações ou compromissos - apresentou-se uma idéia inédita: a da vitória total, a todo custo. Já não se tratava mais de obrigar o inimigo a ceder, a recuar, mas de afligir-lhe chagas incuráveis; não mais de humilhá-lo, mas de destruí-lo. Esse conceito da vitória total condenava a priori ao fracasso qualquer tentativa razoável de pôr fim, mediante compromissos, a um massacre inútil. A guerra mudou não apenas ‘quantitativamente’, mas também, para empregar o conceito hegeliano, qualitativamente. A idéia não nasceu apenas da exasperação dos chefes militares diante do fracasso ou da paralisia de batalhas que consideravam decisivas. Nem provinha dos gabinetes dos diplomatas, das chancelarias. Parecia elevar-se das profundezas populares. Tinha um tom quase místico. Era ideológica. Consistia em demonizar o inimigo, fazer da guerra de forças uma guerra metafísica, uma luta entre o Bem e o Mal, uma cruzada". A vitória dessa idéia foi lembrada por Augusto Del Noce numa anotação inédita: "A recusa da cumplicidade com o mal coincidiu, para mim, com a ‘fuga sem fim’ diante do que me parecia ser o mal, a progressiva destruição do que restava do Sacrum Imperium. A fidelidade ao compromisso de agosto de 1916, antes que a escola começasse para mim".
Anos depois, refletindo sobre tudo isso, o socialista radical francês Anatole France disse a respeito de Carlos: "Foi o único homem decente que apareceu durante a guerra, num posto de dirigente; mas não foi ouvido. Desejou sinceramente a paz, e por isso foi desprezado pelo mundo inteiro. Foi uma esplêndida oportunidade que se perdeu".
As tropas austro-húngaras avançam pelo vale do Isonzo
As tropas austro-húngaras avançam pelo vale do Isonzo

O choro pelo massacre inútil
A guerra continuava e o imperador Carlos I vivia em meio às ruínas e à morte nas trincheiras, ao lado dos soldados de todas as nações envolvidas. Eram os anos das "noites violentadas", como as vivia o então soldado Giuseppe Ungaretti, do lado italiano das barricadas, num sono entrecortado: "O ar é crivado/ como uma renda/ pelas balas/ dos homens/ retraídos/ nas trincheiras/ como caracóis em suas cascas". Em agosto de 1917, ao final da décima primeira batalha do Isonzo, Schumann, fotógrafo da corte, viu _arlos chorar ante os cadáveres carbonizados e despedaçados, e o ouviu sussurrar: "Nenhum outro homem pode responder sobre isso diante de Deus. Eu o farei, o quanto antes". Na Áustria - e por quase toda a Europa - o alimento era escasso; a pobreza, a fome e a morte eram as verdadeiras vencedoras daquele conflito. Carlos sabia disso, e reduziu ao mínimo o nível de vida em sua casa, onde ele e sua família se alimentavam com rações de guerra. O Imperador recusou dar pão branco ao comando supremo de Baden, fazendo com que fosse distribuído entre os doentes e feridos; ante a confusão de seus oficiais, ele mesmo comia tranqüilamente seu pão preto. Organizou cozinhas de guerra, empregou os cavalos da corte para o fornecimento de carvão em Viena, doou e distribuiu até mais do que podia.
Enquanto isso, o aliado alemão pensava em recorrer a armas mais destrutivas. Durante um almoço, o grande almirante Alfred von Tirpitz quis convencê-lo a usar aeroplanos e submarinos para bombardear as cidades italianas; Carlos recusou-se e deixou a mesa. Além do desastre que se via dia após dia, a inteligência política também lhe sugeria que evitasse os bombardeios. Ele sabia que isso aceleraria a entrada dos Estados Unidos na guerra, o que resultaria na ruína para seu país. Mas os alemães não lhe deram ouvidos. Em fevereiro de 1917, o kaiser Guilherme II ordenou a guerra submarina sem nenhuma tolerância, mandando afundar qualquer navio que transitasse nas rotas atlânticas. Foi o grande erro dos Impérios Centrais, pois Wilson resolveu agir e entrou na guerra ao lado da Entente, tomando, na prática, o lugar da Rússia, que, em outubro do mesmo ano, seria agitada pela revolução, e em dezembro assinaria com a Alemanha o armistício de Brest-Litovsk. Apesar de todas as tentativas de Carlos, a paz não foi alcançada pelas armas da diplomacia, mas pelas do fogo.
O ano de 1918 foi o da capitulação. No Piave, no Marne, em Amiens, em Vitório-Vêneto e por toda parte, o destino da Alemanha e do Império Austro-Húngaro estava determinado. Wilson enunciou seus "14 pontos" para a manutenção da paz mundial. A Romênia firmou o tratado de paz com a Entente, a Bulgária se rendeu, a Tchecoslováquia e a Polônia declararam independência, a Turquia subscreveu o armistício e o Kaiser abdicou, permitindo o nascimento, no ano seguinte, da frágil República de Weimar.
Enquanto os eventos se precipitavam, Carlos se viu isolado quando as ruas de Viena foram se enchendo de agitadores enlouquecidos. Em 11 de novembro, assinou um manifesto em que declarava: "Reconheço a priori o que a Áustria alemã decidir em sua opção pela futura forma de Estado. O povo assumiu o governo por meio de seus representantes. Renuncio a qualquer participação no governo do Estado. Ao mesmo tempo, exonero de seu mandato meu governo austríaco". Confiando em políticos que lhe garantiam a manutenção da dinastia se ele se manifestasse publicamente, deixando ao povo a liberdade de decidir a futura estrutura do Estado, Carlos assinou aquela declaração consciente de que não era uma abdicação, que jamais subscreveria, para não faltar ao juramento que fizera diante de Deus ao se tornar imperador. Sua intenção era retirar-se momentaneamente das funções públicas, para atender à insistência com que lhe pediam isso os homens de governo e para evitar um inútil derramamento de sangue. Mas, em 12 de novembro, foi proclamada a queda da monarquia e, na mesma noite, Carlos viu-se obrigado a deixar Viena rumo a seu castelo de caça em Eckarstau, a vinte quilômetros da capital. Enquanto isso, a Hungria estava em plena revolta e o primeiro ministro Tisza era assassinado pelos revolucionários.
Na Postio super virtutibus se lê que, "apesar de toda essa situação, o Servo de Deus continuou todas as noites a rezar o Te Deum, e mandou que o cantassem em 31 de dezembro de 1918 em agradecimento por tudo o que trouxera o ano que terminava. Propuseram-lhe deixar de lado a comemoração, mas ele respondeu que aquele fora um ano de muitas graças, pelas quais tinha de agradecer". E a todos que lhe perguntavam, perplexos, quais tinham sido essas graças, Carlos respondia: "Se este ano foi duro, poderia ter sido bem mais trágico para todos nós. Se uma pessoa está disposta a pegar da mão de Deus o que é bom, é preciso que também esteja disposta a aceitar, com gratidão, tudo o que pode ser difícil e doloroso. Além do mais, este foi o ano do tão suspirado fim da guerra, e pelo bem da paz vale qualquer sacrifício e qualquer renúncia". Carlos teve de renunciar também a sua permanência na Áustria, onde a situação se tornava cada vez mais perigosa para sua vida e a de seus familiares. Em 23 de março de 1919, a família imperial deixou o país rumo à Suíça e, em 3 de abril, o governo austríaco sancionava oficialmente o exílio do soberano e o confisco de seus bens. Foi da Suíça que Carlos tentou duas vezes voltar à Hungria e restaurar o Reino. Por insistência de numerosos homens políticos, militares e simples cidadãos, mas, sobretudo, do papa Bento XV, o qual, segundo o testemunho do último chefe de gabinete do imperador, "expressou-se repetidamente acerca da necessidade de uma restauração na Hungria", Carlos empreendeu duas tentativas fracassadas de voltar ao trono, em março e outubro de 1921. Depois disso, nada mais lhe restou senão o caminho do exílio. Ele repetia sempre aos que ficaram a seu lado naquele momento: "Mesmo que tudo tenha fracassado, temos de agradecer a Deus, pois seus caminhos não são os nossos caminhos".

  "Jesus"
"Em 19 de novembro de 1921, festa de Santa Isabel, aparece no horizonte a ilha do exílio [...]. O imperador distingue as duas torres de uma igreja. ‘Que saudade aquela igreja me dá!’, exclama. ‘Como me lembra as igrejas de meu país! Certamente é dedicada a Nossa Senhora: vamos logo visitá-la’. Era Nossa Senhora do Monte, a igreja em que poucos meses depois viria a ser sepultado": é com essas palavras que Giuseppe Della Torre (Carlo d’Austria. Una testimonianza cristiana. Milão, 1972) conta a chegada de Carlos à ilha da Madeira. Carlos viveria mais cinco meses, e durante sua permanência o povo se deu conta de que aquele homem tinha algo mais importante que o próprio título imperial: "Carlos teve a oportunidade de se aproximar de muitas pessoas; de iniciar com todos um relacionamento humano, imediato; de contagiar a todos com o brilho de sua personalidade, rica em sentimentos e atenções pelo próximo. Foi assim que a simpatia inicial, cheia de compaixão, que os habitantes da ilha demonstraram por ele e sua esposa transformou-se bem cedo num entusiasmo manifesto, que incendiou o espírito de todos".
Quase todos os cidadãos de Funchal estão lá, nesse dia de primavera de 1922. Querem cumprimentar uma vez mais aquele seu amigo que se despedira deles e da vida terrena pronunciando como última palavra um simples nome: "Jesus".
Nesse dia, em Funchal e por toda parte, não há mais impérios ou imperadores para representar o povo cristão na Europa e no mundo. Aquele homem, aquele imperador de trinta e quatro anos, comovera os habitantes da Madeira por algo que nem tinha a ver com seu título real e com o poder que esse título significara. Talvez fosse o afeto com o qual pronunciara aquele simples nome que os havia impressionado naqueles cinco meses. Talvez tenha sido essa mesma coisa que comoveu todos aqueles que o conheceram, na corte ou nas dolorosas trincheiras do início do século. Talvez a única defesa para o povo cristão fosse realmente o afeto por aquele simples nome tantas vezes pronunciado e implorado pelo último imperador.




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Carlos de Áustria nasceu a 17 de Agosto no Castelo de Persenbeug na região da Áustria Inferior. Os seus pais eram o Arquiduque Otto e a Princesa Maria Josefina de Saxónia, filha do último Rei de Saxónia. O Imperador Francisco José I era o tio-avô de Carlos.

Carlos recebeu uma educação expressamente católica e até ao fim da adolescência é acompanhado com a oração de um grupo de pessoas, uma vez que uma religiosa estigmatizada lhe tinha profetizado grandes sofrimentos e ataques contra ele. Daqui teria origem, depois da morte de Carlos, a «Liga de oração do imperador Carlos para a paz dos povos», que em 1963 se torna numa comunidade de oração reconhecida pela Igreja.

Bem cedo cresceu em Carlos um grande amor pela Santa Eucaristia e pelo Coração de Jesus. Todas as decisões importantes eram procuradas por ele na oração.

A 21 de Outubro de 1911 esposou a Princesa Zita de Borbone-Parma. Nos dez anos de vida matrimonial feliz e exemplar, o casal recebeu o dom de oito filhos. Sobre o leito da morte, Carlos dizia ainda a Zita: «Amo-te sem limites!».

A 28 de Junho de 1914, após o assassínio num atentado do Arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do trono, Carlos torna-se herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro.

Enquanto alastrava a I Guerra Mundial, com a morte do Imperador Francisco José, a 21 de Novembro de 1926, Carlos torna-se Imperador da Áustria. A 30 de Dezembro é coroado Rei apostólico da Hungria.

Também esta tarefa é vista por Carlos como uma via para seguir Cristo: no amor pelos povos a ele confiados, no empenho pelo seu bem e no dom da sua vida por eles.

O dever mais sagrado de um Rei - o empenho pela paz - foi colocado por Carlos no centro das suas preocupações no decorrer da terrível guerra. Único entre todos os responsáveis políticos, apoiou os esforços para a paz de Bento XV.

No que diz respeito à política interna, mesmo nos tempos extremamente difíceis encetou uma ampla e exemplar legislação social, inspirada no ensinamento social cristão.

O seu comportamento tornou possível no final do conflito, uma transição para uma nova ordem sem guerra civil. Todavia foi banido da sua pátria.

Por desejo do Papa, que temia a implementação do poder comunista na Europa Central, Carlos procurou restabelecer a sua autoridade de governo na Hungria. Mas duas tentativas falharam, uma vez que ele queria em todo o caso evitar que se desencadeasse uma guerra civil.

Carlos é mandado em exílio para a ilha da Madeira. Uma vez que ele considerava a sua tarefa como um mandato de Deus, não pode abdicar do seu cargo.

Reduzido à pobreza, viveu com a sua família numa casa bastante húmida. Por isso adoeceu gravemente, aceitando a doença como sacrifício pela paz e a unidade dos seus povos.

Carlos suportou o seu sofrimento sem lamentações, perdoando a todos aqueles que tinham magoado e ofendido e morreu no dia 1 de Abril de 1922 com o olhar dirigido ao Santíssimo Sacramento. Como recordou ainda no leito da morte, o lema da sua vida foi: «Todo o meu empenho é sempre, em todas as coisas, conhecer o mais claramente possível e seguir a vontade de Deus, e isto da forma perfeita».



Virtudes cristãs

arlos José de Áustria, ao ser baptizado recebeu o nome de um santo: São Carlos Borromeu. Durante o seu exílio na Madeira, fez-se acompanhar por uma imagem de São Carlos Borromeu e que ofereceu à Igreja Paroquial de Nossa Senhora do Monte, onde hoje ainda podemos ver no mesmo templo na capela lateral do Imaculado Coração de Maria. Nessa mesma Capela esteve sepultado o corpo de Imperador antes de ser construída a actual capela tumular.
A 18 de Maio de 1920 nasceu o filho mais novo do casal polaco Karol Wojtyla e Emília Kaczorowska. Foi dado o 
nome de Karol Jósej. Não foi apenas a repetição do nome do pai, mas a junção dos dois nomes, Karol Jósej, foi em memória do imperador Carlos José de Áustria, que o pai conhecera e admirara, como rei, soldado e cristão, na Primeira Guerra Mundial.

Unidos pelo Dia de SÁBADO

Carlos José de Habsburg tinha uma devoção especial do Sábado, dedicado à devoção de Nossa Senhora. Foi aos Sábados que aconteceram os grandes episódios da sua vida: crisma, casamento, coroação, chegada à Madeira como exilado e morte. Foi crismado a 8 de Setembro de 1900, no Sábado em que se celebrava a Natividade de Nossa Senhora. O futuro imperador casou com a Princesa de Parma Zita de Bourbon no dia 21 de Outubro de 1911, num Sábado. Depois de coroado Imperador da Áustria, foi a Budapeste onde a 30 de Dezembro de 1916 foi coroado rei da Hungria com o nome de Carlos IV, num dia de Sábado. Chegou exilado à Madeira no dia 19 de Novembro de 1921 também em dia de Sábado. Faleceu também num Sábado, o primeiro do mês, a 1 de Abril de 1922 na freguesia de Nossa Senhora do Monte.
João Paulo II também foi um homem de grande devoção do Sábado: Foi num Sábado, 13 de Abril de 1929 que faleceu a sua mãe. Foi num Sábado, 14 de Outubro de 1978, que entrou no Conclave donde, dois dias depois sairia já como Papa João Paulo II. Foi num Sábado, 13 de Maio de 2000, que ao visitar pela terceira vez o Santuário de Fátima, revelou o chamado terceiro segredo de Fátima, no qual ele próprio se revia. Finalmente, foi no primeiro Sábado do mês, 2 de Abril de 2005, que morreu santamente.

Unidos na devoção e protecção MARIANA

Carlos de Absburgo ao notar que no anel de casamento da mãe da sua noiva Zita estava gravado: Sub Tuum praesidium configimus, Sancta Dei Genitrix (À tua protecção nos recorremos Santa Mãe de Deus), logo mandou que a mesma inscrição fosse gravada na sua aliança e na da sua esposa. Mais tarde, aquando da Primeira Guerra Mundial, mandou que a mesma inscrição ‘Sub Tuum praesidium’ fosse gravada no sabre que havia de usar. Costumava visitar com frequência os vários santuários marianos e foi ajoelhado junto da imagem de Nossa Senhora de Cabeça Inclinada que o Jovem imperador tomou a coroa como soberano. Na sua chegada à baía do Funchal, ao olhar para a montanha viu a Igreja e as suas duas torres de Nossa Senhora do Monte, terá dito: ‘Deve ser um templo dedicado a Nossa Senhora; em breve iremos visitá-lo…’ Não só teve oportunidade de visitar, como de viver os últimos 45 dias da vida e aí descansar pela eternidade…
Também o Papa João Paulo II desde sempre expressou a mesma devoção mariana. Escolheu como lema do seu pontificado a expressão: Totus Tuus, Maria! (Sou todo teu, Maria). Era muito devoto de Nossa Senhora de Czestochowa, o grande santuário mariano da Polónia, consagrado à Mãe de Deus. Foi alvo de um atentado no dia de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, que segundo a sua fé, o protegeu e o amparou numa vida que se prolongou com gratidão por essa protecção. Também na Madeira João Paulo II rezou à mesma Senhora do Monte durante a concelebração eucarística no Funchal onde se encontrava a imagem da mesma Senhora…

Unidos na HORA da sua chegada à MADEIRA

O Imperador Carlos da Áustria, chegou ao Porto do Funchal, pelas 10H35 do dia 19 de Novembro de 1921, a bordo do cruzador inglês ‘Cardiff’. À mesma hora, mas 70 anos depois, no dia 12 de Maio de 1991 chegou o Papa João Paulo II ao Aeroporto da Madeira.

Unidos no MÊS e DIA da sua MORTE:

A Providência também juntou os dois Beatos no calendário da sua morte: O Imperador Carlos de Áustria faleceu no dia 1 de Abril de 1922, ao fim da manhã, na véspera do dia de Páscoa. O Papa João Paulo II morreu no fim da tarde do dia 2 de Abril de 2005, véspera do II Domingo de Páscoa ou do Domingo da Divina Misericórdia. 

Unidos no DIA da sua MEMÓRIA

João Paulo II beatificou o Imperador Carlos de Áustria e determinou que a sua festa ou memória fosse celebrada no dia 21 de Outubro. Foi o dia do seu matrimónio, como exemplo de santidade matrimonial para os dias de hoje, recordando a promessa mútua do casal imperial: «Agora devemos conduzir-nos um ao outro para o céu!»
O dia escolhido para a festa e memória do Beato Papa João Paulo II foi 22 de Outubro, o início do seu pontificado, como eco da sua mensagem e missão: «Não tenhais medo de acolher Cristo…Procurai abrir, melhor, escancarar as portas a Cristo! Não tenhais medo!...».


Pe. David Quintal, SCJ


2


A vida religiosa do último Imperador da Áustria
Estudo dos documentos do Processo
Giovanna Brizi
“Os reis de toda a terra hão de louvar-vos, ó Senhor” (Sl 138,4).
“Entre os reis que se distinguiram por terem louvado e glorificado o Senhor
com a santidade da vida e das obras, está incluído, sem dúvida, o Servo de Deus Carlos
da Áustria. Ele, de fato, consciente da origem divina de toda autoridade humana,1 não
aproveitou da própria posição de soberano para obter vantagens pessoais e sempre
agiu segundo a justiça, para bem do seu povo, para o crescimento do Reino de Deus e a
liberdade da Igreja que, como está expresso também na mensagem do Concílio
Vaticano II aos governantes, pede a estes que assegurem “a liberdade de crer e de
praticar sua fé, a liberdade de amar o seu Deus e de servi-lo, a liberdade de viver e
levar aos homens sua mensagem de vida”2
Com estas palavras cheias de luz, abre-se o texto do “Decreto sobre as
virtudes”, redigido por ocasião do reconhecimento, por parte dos Consultores
Teológicos (29 de outubro de 2002) e dos Cardeais e Bispos (em abril de 2003), da
prática em grau heróico das virtudes teologais, cardeais e anexas pelo Servo de Deus
Carlos da Áustria.
Compreendendo a “religiosidade” como “sentimento que exprime a experiência
religiosa no plano individual”,3 é evidente que cada percurso humano, desemboque ou
não na santidade canonizada, deve ser entendido, em virtude disso mesmo, como único
e irrepetível. Esta necessária premissa de caráter geral, aparentemente tautológica, vale
ainda muito mais para a figura, tão rica e complexa, que vamos analisar aqui sob o perfil
religioso.
Outra premissa a termos presente é o programa espiritual que sempre
determinou as escolhas deste jovem e desafortunado Imperador, que morreu com trinta
e quatro anos, pobre e exilado numa ilha do Atlântico. Na última noite de sua vida, 1º de
abril de 1922, ele disse à sua esposa: “Agora, quero dizer-lhe com absoluta franqueza
como se dá comigo: Todo o meu empenho sempre foi reconhecer claramente, em tudo,
a vontade de Deus e segui-la da maneira mais perfeita”.4 E este empenho o
acompanhara todos os dias de sua vida.
Percorrendo as etapas de sua vida, pode-se muito bem dizer que, nele, esta
incansável vontade de conhecer e seguir a Vontade Divina se transforma no pão
quotidiano, no alimento essencial para aceitar sempre com resignação e serenidade as
derrotas, as calúnias, as adversidades que precisou sofrer em sua breve existência.
Para ele, tudo foi dom de Deus, tanto as alegrias como as adversidades. Também
gostava de repetir com freqüência: “Encontramo-nos nas mãos da Divina Providência.
Tudo o que nos acontece está bem. Apenas confiemos”.5
A Sra. Maria Lackner, que estava com seu marido, no dia 31 de dezembro de
1921, na Ilha da Madeira, conta como foi esta última Passagem de Ano na casa do
1 Cf. Rm 13,1
2 Decreto sulle virtù, Aprile 2003
3 Dizionario Zanichelli
4 Positio super virtutibus et fama sanctitatis, Roma: 1994. Summ. docc. T.I.S., p. 107.
5 Summ. test. p. 600, § 780, Imperatriz Zita.
Imperador, quando verdadeiramente todo o mundo parecia desmoronar sobre o Servo de
Deus.
“À tarde, como devoção de encerramento do ano, houve na capela da casa uma
solene Bênção Eucarística. Estávamos apenas o Imperador, a Imperatriz e nós.
Também foi rezado o ‘Te Deum’. Atrás de nós, ficava um ano que tinha sido o mais
duro da vida do Servo de Deus. Ele encontrava-se longe da pátria, no exílio; na mais
drástica necessidade material; estava separado de seus filhos e não sabia o que o dia
seguinte haveria de lhe trazer de mal. Durante o ‘Te Deum’, nós, um após o outro,
fomos nos silenciando, porque a dor nos fazia fugir a voz. Somente o Servo de Deus
manteve-se firme e entoou forte e claramente o cântico ambrosiano até o fim,
acentuando cada palavra. (...) Olhei-o com admiração. Percebia-se com toda
evidência que para ele, naquele momento, existia apenas Deus – ninguém mais – e que
aquele ‘Te Deum’ era um íntimo diálogo entre Deus e o seu mais fiel servidor. Na
época, ele não sabia se tornaria a ver seus filhos, não sabia o que o dia seguinte
haveria de lhe trazer, e contudo, rezou com muito fervor aquela oração de ação de
graças”.6
Mas tudo isso seria bem pouco, se este esforço quotidiano de fazer a vontade de
Deus tivesse permanecido somente um ideal, algo “desencarnado”. Pelo contrário,
podemos afirmar que se concretizava em todos os campos, sobretudo no seu
relacionamento com o próximo: do amor incondicionado a Deus brotava outro, muitas
vezes mais difícil de viver, voltado para o próximo. Podemos afirmar com São Tiago
que a fé cooperava com as obras, e através dessas obras, a fé se torna perfeita.7
É preciso, então, percorrer a vida do Servo de Deus sob o aspecto religioso
libertando o espírito, tanto quanto possível, de juízos pré-formados e de preconceitos,
buscando reconhecer nela os traços de Deus e a natureza humana de Carlos. De fato,
buscaremos mostrar não um homem ascético, impecável, tão distante do sentir comum
como irreal, mas “julgar a vida e as obras de um homem que, na sua breve existência,
exerceu um cargo que por muito tempo no mundo ocidental foi o mais elevado que um
leigo poderia ocupar, isto é, o de Imperador. E ele esteve à frente, justamente, daquele
Império que pode ser considerado o legítimo herdeiro do extinto poder do Sacro
Império Romano”.8
A principal fonte de onde haurir as melhores e mais fidedignas notícias sobre a
vida do Servo de Deus é, sem dúvida, a “Positio super virtutibus et fama sanctitatis”,
que agrupa no seu conjunto pouco menos de 2.700 páginas, com mais de 85 textos
provenientes dos interrogatórios do Processo Ordinário de Viena e dos inquéritos de
Luxemburgo, Nova York, Friburgo, Paris, Le Mans e Funchal. Mais de 70 entre esses
relatos são de testemunhas oculares. A massa de documentos anexos é também muito
impressionante: mais de 1120 páginas. Um estudo independente da Drª Elisabete
Kovàcs sobre a “Conformidade entre textos e documentos”, que faz parte integrante da
própria Positio, unido a outros três estudos históricos específicos preparados pelos
renomados membros da Comissão Histórica, assim conclui: “Como já constatado,
todos os fatos históricos encontrados nos testemunhos verbais, concordam com os
conhecimentos da investigação (...)”.9 Então, não existem razões científicas válidas para
duvidar da credibilidade dos dados expostos na Positio.
“Carlos viu a luz do mundo em 17-8-1887, em Persenbeug, às margens do
Danúbio. Um menino delicado, pequeno, que devia ser criado com muito cuidado e
6 Summ. test. pp. 390-391, §§ 561-562, Maria Lackner.
7 Cf. Tg 2,22
8 Relatio et vota di Consultori storici, Voto 4, T.I.A., p. 22
9 Positio, Summ. docc. II, p. 521
amor”.10 Assim testemunha a Marquesa Crescência Pallavicini, dama de corte da jovem
Maria Josefa, mãe do Servo de Deus.
O parto foi particularmente difícil – tanto é que o menino nasceu com o fórcipe –
e quase custou a vida de sua mãe.
O ambiente familiar que acolheu o pequeno Carlos não foi, certamente, um dos
melhores. O matrimônio de seus pais, de fato, não podia ser definido como um
casamento feliz. A mãe, Arquiduquesa Maria Josefa, por nascimento Princesa da
Saxônia, era uma “mulher muito piedosa, rigorosamente católica, mas não possuía
nenhuma flexibilidade e vivia sempre segundo um programa estabelecido; não sabia
demonstrar o amor e calor que, provavelmente, sentia dentro de si”,11 como declara sua
neta Elisabete Carlota.
De uma personalidade totalmente diferente era o seu pai, o Arquiduque Otto
Francisco José da Áustria: “homem muito atraente, bom, mas de caráter um pouco
fraco. Seu grande charme, sua beleza, espírito de artista e o seu jovial prazer com os
divertimentos, podem, muito provavelmente, terem dado motivos a faltas em sua
juventude”.12
Apesar da diferença de caracteres, ambos sempre tiveram a peito a educação
moral, civil e religiosa do seu primogênito, subtraindo-o ao risco de crescer como “filho
do Estado” devido à sua proximidade dinástica do trono.
Como todas as crianças de sua estirpe, ele é confiado a várias governantas e,
depois, a alguns preceptores que se ocupam de maneira concreta da educação do
jovenzinho, embora sob as diretivas da mãe, que nunca intervinha pessoalmente, mas
limitava-se a um poder, diríamos, de vigilância.
Entre seus preceptores, aquele que exerceu maior influência na formação do
futuro Imperador foi, sem dúvida, o Conde Jorge Wallis: “católico praticante e muito
piedoso; fiel servidor do Imperador até o fundo da alma”.13 Amou ao pequeno como a
um filho seu, mas “fora de dúvida, com a melhor das intenções, usou com o jovem
Arquiduque de uma rigidíssima disciplina, que certamente deu origem a algumas horas
duras à criança, por natureza delicada de corpo e espírito”.14 Aos vários tutores leigos
vieram também se ajuntar sacerdotes para a formação religiosa do menino. Primeiro, o
Padre Norberto Geggerle, O.P. e, em seguida, o Bispo sufragâneo Dom Gottfried
Marschall, que lhe deu a Primeira Comunhão e administrou-lhe a Crisma.
Como é natural para as crianças de sua idade, Carlos teve a oportunidade de
alternar durante seu dia os momentos de estudo e de lazer. Particular atenção foi dada ao
estudo das línguas, pois era de norma conhecer todas as línguas faladas no vasto
Império. Algumas testemunhas falam que o Servo de Deus era fluente em mais de sete
línguas.
Todas as testemunhas são concordes em descrever Carlos como um menino
cheio de vida, inteligente, obediente, bom, generoso e sensível, de saúde frágil,
inclinado às funções religiosas e às práticas de piedade.
Criança “sobremaneira conscienciosa, nunca passava perto de uma igreja sem
parar para fazer alguma oração; era visto muitas vezes na capela da própria casa;
dizia pontual e conscienciosamente suas orações diárias; todas as tardes fazia seu
exame de consciência com rigor”.15 Visitava com muito gosto os santuários marianos,
10 Summ. test. p. 74, Marquesa Crescência Pallavicini.
11 Summ. test. pp. 195-196, Arquiduquesa Elisabete Carlota da Áustria e Princesa de Liechtenstein.
12 Summ. test. p. 40, Condessa Teresa Korff Schmising Kerssenbrock.
13 Summ. test. p. 128, Anna Tachezy.
14 Summ. test. p. 786, Condessa Teresa Korff Schmising Kerssenbrock.
15 Summ. test. p. 63, § 80, Rafaela Schmalzhofer Holzlechner.
em especial o de Maria Taferl, dos quais trazia para casa pequenas lembranças. Certa
vez, uma casa pegou fogo perto de Reichenau e o menino logo esvaziou seu cofrinho
para dar o dinheiro à família atingida pelo incêndio.16
Remonta também ao período de sua infância o significativo episódio referido por
sua esposa, a Imperatriz Zita: “O Servo de Deus tinha grande devoção à Mãe de Deus
como sua Mãe do céu. Certa vez, quando menino, brincando, lançou ao ar um galho de
árvore e este, por acaso, atingiu um pequeno nicho dedicado à Virgem. Embora isso
tivesse ocorrido sem nenhuma intenção de sua parte, o Servo de Deus começou a
chorar imediatamente, porque lhe doía muito ter ferido Nossa Senhora. Por toda a sua
vida, mostrou uma especial devoção aos nichos dedicados a Virgem Maria, e com
muita freqüência decorava-os com flores ou guirlandas para manifestar-lhe – como me
disse – que nunca quis machucar Nossa Senhora”.17
Os anos da juventude, Carlos os transcorreu com a família em Viena, em
Augarten. Dali, ia com facilidade até a igreja paroquial de São Leopoldo para dedicar-se
às práticas de piedade, sempre que podia. Todos os seus tutores descrevem-no como um
rapaz irrepreensível, com grande autodomínio, reservado e modesto, sem interesse no
relacionamento com mulheres,18 mas, também, sereno e alegre, dado às viagens e a
outros sãos divertimentos.19
Devido a uma queda de patins, causada deliberadamente por um coetâneo
ciumento, Carlos sofreu uma grave fratura na perna, cujas seqüelas carregará para
sempre, jamais recuperando a perfeita desenvoltura para andar. Tal episódio é
particularmente elucidador para compreender o ânimo do Servo de Deus: não só sempre
se recusou a dizer o nome do rapaz que lhe havia causado um tão grave dano, mas
também nunca lhe guardou rancor, embora tivesse que se submeter a uma dolorossíma
cirurgia sem anestesia e de êxito incerto.20
Seguiu seus estudos ginasiais e colegiais, como aluno externo, no
“Schotttengymnasium” de Viena e, depois, segundo as precisa indicações de seu pai
Otto,21 os estudos universitários, com direcionamento jurídico-econômico, em Praga.
Em 1903, como era o costume, inicia-se para ele a carreira militar. Tinha apenas
16 anos quando foi nomeado Subtenente do 1º regimento dos Ulanos e foi-lhe conferido
ser membro da “Ordem do Tosão de Ouro”. “As fortes implicações religiosas que esta
Ordem exige de seus cavaleiros e o privilégio de poder ter uma Santa Missa celebrada
junto a si em qualquer parte, causaram particular satisfação ao Servo de Deus”.22
Também no que diz respeito à vida militar, o juízo é absolutamente unânime:
sempre zeloso e consciencioso, disponível para com seus companheiros, solícito para
com eles, não lhes fazendo pesar o seu grau e o seu posto. Sentiu-se perfeitamente à
vontade na vida militar e vestiu a farda quase até a morte, não como sinal de autoridade,
mas de serviço à Pátria. Muito querido por seus companheiros, independentemente da
etnia a que pertencessem, professou sempre abertamente a sua fé, jamais descuidando
da recitação do Benedicite23 e do Angelus.
É nesta fase que se dá aquilo que sua esposa Zita define como “um eclipse de
poucos meses” e que ela mesma conta nos seguintes termos:
16 Summ. test. pp. 786-787, § 958, Condessa Teresa Korff Schmising Kerssenbrock.
17 Summ. test. p. 563, § 744, Imperatriz Zita da Áustria e Rainha da Hungria.
18 Summ. test. p. 64, § 81, Rafaela Schmalzhofer Holzlechner.
19 Summ. test. add. p. 81, Marquesa Crescência Pallavicini.
20 Summ. test. pp. 198-199, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
21 Summ. test. pp. 87-88, Carta do Arquiduque Otto da Áustria.
22 Summ. test. pp. 67-68, § 20, Imperatriz Zita.
23 NT: A bênção da mesa antes das refeições.
“Por certo tempo, depois da declaração de sua maioridade e a completa
liberdade que esta trouxe consigo (casa própria, dinheiro próprio, distanciamento da
família e de todos os amparos existentes até então), sua aspiração à perfeição caiu na
tibieza. Um grande impulso para isso foi dado pela infeliz afirmação do Arquiduque
Francisco Ferdinando. Este, depois da morte de seu pai, tornara-se seu tutor e era
considerado um fervoroso católico. Deu ao jovem rapaz alguns conselhos para sua vida
futura e lhe disse: ‘Guarde-se das mulheres; mas, se você não puder passar sem elas,
então, faça como eu fiz: cuide de sua saúde!’ Dado que meu sogro tinha morrido em
virtude de uma doença desta espécie, tais palavras chocaram fortemente o rapaz, que
pensou consigo mesmo que se alguém como o seu tio Francisco podia dar-lhe um tal
conselho, então, a severidade com que a questão fora até agora tratada não podia ser
justificada do ponto de vista religioso. Julgou, assim, que o motivo de pintar tão negro
este pecado era, sobretudo, a preocupação de que ele viesse a ser vítima de uma grave
doença, como seu pai. Contudo, resistiu ainda por algum tempo às sugestões de vários
colegas do regimento, os quais igualmente lhe asseguravam que não havia nada de mal
naquilo. Por fim, foi esclarecer suas dúvidas no confessionário, as quais agravaram-se
em virtude de sua jovem idade. O sacerdote não deve ter compreendido bem a
pergunta, uma vez que o esclarecimento recebido, de forma alguma, era positivamente
contrário. Apesar disso, demorou ainda algum tempo até que dois de seus
companheiros trancaram-no com uma mulher. Este foi o início de ‘um eclipse de
poucos meses’. O Servo de Deus disse-me que suas faltas naquele período foram
raríssimas, pois sempre lhe assaltavam um grande arrependimento e aversão.
Depois de breve tempo, renunciou definitivamente a esta vida e voltou a
exercitar-se nas virtudes. Após ter-me dito estas coisas, o Servo de Deus perguntou-me
se depois desta comunicação eu ainda estava disposta a casar-me com ele. Sentia como
um dever de consciência confessar-me, antes do casamento, estas suas faltas. Ao
mesmo tempo, prometeu-me manter inviolavelmente a fidelidade. Antes das núpcias, o
Servo de Deus também me declarou que tinha feito diante de Deus o explícito
juramento de que me haveria de confessar, no máximo em vinte e quatro horas,
qualquer falta. Ele sentiu-se induzido a fazer isso em virtude do infeliz matrimônio de
seus pais, pois julgava que a causa desta infelicidade conjugal estava na falta de
confiança entre seu pai e sua mãe”. 24
Qualquer acréscimo ou omissão ao presente relato, feito pelo próprio Servo de
Deus à sua noiva e à sua futura sogra, são igualmente arbitrários.
Em 1911, casou-se com Zita de Bourbon-Parma. Sem dúvida, não foi uma
escolha improvisada, visto que ambos já se conheciam desde crianças, pois Carlos tinha
laços de amizade com os irmãos de Zita.
O matrimônio foi celebrado por Dom Bisleti, que leu o sermão preparado pelo
próprio Papa Pio X para essa ocasião. Tendo recebido em audiência privada há pouco
tempo a futura esposa, ele predisse que Carlos seria Imperador e a exortou a alegrar-se
“porque via no Servo de Deus a recompensa que o céu outorgava à Áustria por toda a
sua fidelidade à Igreja e ao Papa”.25
Certamente, o Servo de Deus foi conquistado pela bela e numerosíssima família
de Zita. Madre Antônia de Bourbon-Parma, religiosa beneditina e irmã de Zita, está
convencida de que “o Servo de Deus sentiu-se arrebatado pela nossa bela vida
familiar, pela atmosfera profundamente cristã e tão pura da nossa casa”.26
24 Summ. test. pp. 63-64, § 18, Imperatriz Zita.
25 Summ. test. p. 568, Imperatriz Zita.
26 Summ. test. p. 893, ad 100, Madre Maria Antônia de Bourbon-Parma.
Ambos os noivos prepararam-se com muita seriedade para o matrimônio,
conscientes do sacramento que iriam receber, cuidadosamente orientados pelo Padre
Carlos Maria Andlau, famoso pregador jesuíta, a quem Carlos teve a oportunidade de
conhecer no Colégio dos jesuítas em Kalksburgo, para onde se dirigia a fim de praticar
esportes quando jovem.27 Padre Andlau teve muita influência na vida do Servo de Deus
e, durante um certo tempo, foi também seu confessor.
Foi com estrema seriedade e convicção que Carlos disse à sua futura esposa:
“Agora, devemos nos ajudar um ao outro a chegar ao céu”.28 Confiando no auxílio
divino, quis que nas alianças fosse gravado “Sub tuum praesidium confugimus, Sancta
Dei Genitrix” (À vossa proteção recorremos, ó Santa Mãe de Deus) e, nos dias que se
seguiram ao matrimônio, o jovem casal foi em peregrinação a Mariazell, onde colocou
sob a proteção de Nossa Senhora a vida conjugal que estava a se iniciar.
Madre Maria Antônia descreve assim a vida familiar do casal: “Um modelo
concreto do ideal cristão; uma harmonia perfeita de pensamentos e princípios. Sem
segredos entre eles, eram totalmente abertos e leais um ao outro. Otimistas por
natureza, a graça divina produziu neles uma confiança heróica em Deus, um fervoroso
amor por Cristo e uma ilimitada fé em seu amor, o qual era fortificado pela devoção ao
Sagrado Coração de Jesus e à Nossa Senhora. O Servo de Deus sempre foi o melhor
dos maridos para sua esposa e pai exemplar para seus filhos. Rezavam com freqüência
juntos e ocupavam-se ativamente da educação dos filhos. O Servo de Deus falava muito
das questões religiosas com sua esposa e, também, da vida espiritual. E, se ela ajudouo
a abrir-se, ele lhe mostrou, na sua maneira de ser tão simples, o caminho da
perfeição”.29
Sem dúvida, Zita teve uma forte influência no crescimento espiritual do marido,
trazendo à família dos Habsburgo outras fortes e enraizadas tradições católicas dos
Bourbon.
Depois do casamento, Carlos prosseguiu com sua carreira militar e, tal como
para seu pai, também para sua nascente família, as mudanças foram numerosas e nem
sempre confortáveis.
Teve a possibilidade de participar com entusiasmo do Congresso Eucarístico que
se deu em Viena em 1912, junto de sua jovem esposa que, dentro em pouco o faria pai
do primeiro de seus amadíssimos oito filhos, o último dos quais veio à luz depois de sua
morte.
Com o assassinato do tio Francisco Ferdiando, ocorrido aos 28 de junho de
1914, Carlos torna-se o Herdeiro Presuntivo. Mas, o homicídio em Saravejo foi o início
do fim: a Europa e a Áustria jamais voltariam a ser as mesmas, e Carlos, num turbilhão
de acontecimentos, encontrar-se-ia lançado numa das maiores tragédias da História
moderna.
“Pio X, logo após o assassinato do Arquiduque em Saravejo, enviou a Carlos,
através de um alto funcionário do Vaticano, uma carta na qual lhe pedia que
apresentasse a Francisco José o perigo de uma guerra que haveria de trazer enormes
desgraças para a Áustria e toda a Europa. Mas, o conteúdo dessa carta veio a ser
conhecido por quem tramava a favor dos eventos bélicos, e o funcionário foi
interditado na fronteira italiana. Carlos recebeu a missiva muito tempo depois, em
pleno conflito, quando já era tarde demais para esconjurá-lo”.30
27 Summ. test. p. 171, Barão Gustavo Grimm-Szepes Etelvar.
28 Summ. test. p. 70, Imperatriz Zita.
29 Summ. test. pp. 854-855, Madre Maria Antônia de Bourbon-Parma.
30 Summ. test. p. 769, § 936, Príncipe Xavier de Bourbon-Parma.
Depois do estourar da guerra, Carlos entra no Supremo Comando Militar do
Arquiduque Frederico e do Marechal de Campo Conrado von Hötzendorf, para ser
introduzido, na qualidade de futuro Imperador, na alta estratégia militar, depois de ter
cursado a instrução teórica junto ao Estado Maior. Aos 10 de setembro de 1914, Carlos
chega ao fronte, na Galícia, mas devido ao comportamento hostil de von Hötzendorf, foi
excluído do Comando. Sentindo-se inútil, pede e obtém licença para poder visitar, em
nome do Imperador, as tropas da primeira linha. Conhece, assim, todos os comandantes
em segunda e os soldados em todos os setores dos vários frontes, condecorando os
oficiais de mérito e oferecendo relatórios não falsificados sobre a situação militar a
Francisco José. Em 1916, Carlos teve o Comando do XX Corpo de Armada
(Edelweiss). A sua ação foi decisiva para vencer a Romênia e para deter o avanço dos
russos, enquanto que a ofensiva no fronte italiano culminou com a vitória de Folgária.
“Dos seus sucessos militares, a História nos fala”,31 mas, sem dúvida, em
nenhuma vitória encontrou satisfação. Ver aqueles escombros e corpos massacrados era
para ele, homem de paz, absolutamente insuportável.
Lê-se que, “permanecendo em perfeita tranqüilidade, sob os carregados
tiroteios, ele, de fato, desgastou o terço de ouro que trazia sempre consigo, rezando-o
em segredo. Assim, a Arquiduquesa precisou arranjar-lhe um novo”.32 Este terço fora
presente de Pio X.33 Certa vez, para salvar um oficial subalterno, aventurou-se entre as
ondas do rio Isonzo em cheia, arriscando a própria vida.34 A fim de que não fossem
feitos sacrifícios inúteis, inspecionava sempre pessoalmente as posições no fronte,
expondo-se ao perigo. Buscou, em vão, obter tréguas temporárias para permitir a
salvação dos feridos depois das batalhas mais duras.
Como Comandante do Corpo, o Arquiduque Carlos era particularmente querido,
pois era solícito como um pai para com as necessidades físicas e espirituais dos seus
subalternos. O Padre Bruno Rodolfo Spitzl, capelão militar, conta a este propósito que,
durante uma marcha forçada de um destacamento do seu regimento ao longo da estrada
do vale de Astico rumo a Arsiero, o Servo de Deus ocupou-se providencialmente de um
velho soldado que, devido a ferimentos nos pés, não conseguia mais caminhar. O
médico julgou-o estar agindo com fingimentos e, assim, repreendeu-o asperamente.
Carlos constrangeu o médico a verificar, na sua presença, as condições do pobre
homem. “O médico sentiu-se incomodado quando viu aquilo que se apresentava a seus
olhos e escutando o sucessor ao trono dizer-lhe: ‘Não creio que nem o senhor, nem eu
teríamos marchado por tanto tempo como este homem com os pés neste estado!
Providencie o mais rápido possível que ele parta para um hospital. Depois, irei pedir
um relatório”.35
Ainda o Padre Spitzl recorda o cuidado e atenção que o Servo de Deus
demonstrava nas suas inspeções a fim de que os soldados tivessem a necessária
assistência espiritual e como o viu aliviado ao saber “que no regimento se dava pouca
importância às funções religiosas de ostentação e que se buscava, sobretudo, pelo
menos uma vez ao mês e em todas as subdivisões – mesmo nos lugares de combate – a
oportunidade de se ter a Santa Missa e de receber os santos sacramentos”.36
31 Summ. test. pp. 367-369, Dr. Erich Thanner.
32 Summ. test. p. 369, Dr. Erich Thanner.
33 Summ. test. p. 564, § 746, Imperatriz Zita.
34 Summ. test. p. 328, ad 13, Baronesa Zdenka von Gudenus.
35 Summ. docc. pp. 165-166, Padre Bruno Rodolfo Spitzl.
36 Summ. test. p. 166, Padre Bruno Rodolfo Spitzl.
Humanamente falando, cumpriu sempre de modo perfeito o códice cavalheiresco
de todo bom oficial, mas como cristão procurou sempre colocar em prática as obras de
misericórdia corporais e espirituais em favor de seu próximo.
Aos 21 de novembro de 1916, depois de dois anos do início da hostilidade, com
a morte do tio-avô Francisco José, Carlos torna-se Imperador com o nome de Carlos I.
O momento é assim recordado pela Imperatriz Zita: “No dia 21 de novembro de
1916, junto ao leito de morte do Imperador Francisco José, o Servo de Deus assumiu o
reino. Foi um momento particularmente comovente; ele o aceitou ajoelhado diante da
imagem de ‘Nossa Senhora da cabeça inclinada’, com o rosário nas mãos”.37
“Por sua vontade pessoal, no Manifesto de Ascensão ao trono foi inserida uma
frase que afirmava o absoluto desejo de paz do jovem monarca”.38
No dia 30 d dezembro seguinte, foi coroado Rei Apostólico da Hungria com o
nome de Carlos IV.
A dualidade da monarquia Austro-húngara remontava a 1867, quando, com o
reconhecimento da autonomia húngara, os territórios do Império foram divididos em
dois blocos: a Cisleitânia, sob administração austríaca, e a Transleitânia, sob
administração húngara. As Constituições, os governos e presidentes dos Conselhos eram
distintos, enquanto que as duas partes conservavam em comum o Imperador –
Imperador da Áustria e Rei da Hungria – e os Ministérios das Relações Exteriores, das
Finanças e da Guerra.
Sua esposa assim descreve o evento: “Para ele, a coroação teve um significado
extraordinariamente grande; considerava a investidura que a Igreja lhe concedia em
nome de Deus. Todos os deveres que naquela solene cerimônia o Servo de Deus jurou
cumprir, ele os assumiu com a mais profunda fé e fez deles o programa de sua vida
futura. Na coroação, todo o povo é confiado por Deus ao soberano e, a partir de então,
ele deve viver para os seus súditos; cuidar, rezar, sofrer por eles e santificar-se para
conduzi-los a Deus. O dia da coroação foi um grande momento na vida do Servo de
Deus que, desde aquele acontecimento, andou ainda mais decidido rumo a Deus”.39
Este aspecto é verdadeiramente fundamental para compreendermos as sucessivas
escolhas feitas pelo Servo de Deus: “a graça de sua dignidade de soberano provinhalhe
de Deus, e a consagração por parte da Igreja parecia-lhe essencial”.40 Foi por isso
que alimentou o propósito de, uma vez terminada a guerra, fazer-se ungir de maneira
solene também Imperador da Áustria. Um juramento puramente formal sobre uma
Constituição – que ele, aliás, tinha em mente mudar – não responde, de modo algum, às
suas íntimas convicções. É soberano por graça de Deus; não para sua glória pessoal,
mas para servir aos seus povos e a Igreja de Cristo. Obedecendo à diretiva espiritual de
São Roberto Bellarmino, ele levará o cetro como se leva a cruz.
Alguns dias depois da ascensão ao trono, Carlos assumiu automaticamente o
Comando Supremo de todas as tropas e, também nesta qualidade, visitou muitas vezes
os frontes, indo até as primeiras linhas e tomando parte pessoalmente em numerosas
batalhas, sempre revelando coragem e calma exemplares, mesmo debaixo dos golpes da
artilharia inimiga. Contudo, diante das carnificinas, entrava num forte conflito com
aqueles profundos princípios morais e religiosos dos quais o seu ânimo estava
impregnado. Poucas horas depois do término da décima primeira batalha de Isonzo, o
fotógrafo da corte, Schuhmann, viu-o chorar à vista dos cadáveres carbonizados e
37 Summ. test. p. 533, Imperatriz Zita.
38 Summ. test. p. 369, § 540, Dr. Erich Thanner.
39 Summ. test. pp. 533-534, Imperatriz Zita.
40 Summ.test. p. 142, ad 16, Ana Francisca Maria Lamich.
dilacerados. Naquela ocasião disse: “Nenhum homem pode responder por isso diante de
Deus. Eu ponho um ponto final. E isso, o mais breve possível”.41
Como Imperador, tornou-se ainda mais forte a sua convicção de dever percorrer
todas as possíveis vias diplomáticas para conseguir a paz. E isso a tal ponto que os
aliados alemães o acusaram de covardia, pois só conheciam uma possível paz: a “paz
vitoriosa”.
Também prodigalizava-se como podia para mitigar as atrocidades da guerra.
Opôs-se firmemente ao uso de gases letais no fronte oriental; foi irremovível na sua
decisão de não fazer bombardear as cidades italianas; bateu-se contra o emprego dos
submarinos para atingir as cidades inimigas localizadas à margem do Adriático –
primeira entre todas, Veneza –, apesar do escárnio, dos insultos e da indignação do
aliado alemão. Para ele, a população civil era absolutamente intocável.
“Destituiu ou colocou em postos que não tinham importância política e militar
os responsáveis pelo estourar da guerra”.42
Ao mesmo tempo, com o intuito de salvaguardar a moralidade de seus soldados,
abraçou com entusiasmo a idéia do Padre Guilherme Schmidt de instituir, em todos os
frontes, as “Casas do soldado” onde qualquer um poderia encontrar uma acolhida
familiar e a oportunidade de um entretenimento e de comprar gêneros disponíveis com
um bom preço. Aí também havia jornais e revistas, livros e jogos honestos. Estas casas
impediam que os militares se dessem a distrações menos proveitosas à alma e ao corpo,
e tornaram-se um modelo para todos os Estados beligerantes. Naturalmente, nem
sempre as iniciativas do Servo de Deus foram aceitas de boa vontade. Por exemplo, o
General Bardoff achou motivos de críticas a propósito das enérgicas medidas imperiais
contra certos “usos imorais” (os bordéis) do exército, considerados “higiênicos e
razoáveis” pelos militares de grau mais elevado.43 Cuidou pessoalmente da distribuição
de rosários entre os militares; com um rescrito, fez com que se celebrasse a Missa nas
estações de aquartelamento, não só nos domingos e dias festivos, mas também nos dias
feriais, com um sermão.44
Buscou, tanto quanto lhe era possível, atenuar e tornar mais humana a situação
dos prisioneiros de guerra; participou de iniciativas de repatriamento entre o Império
Austro-húngaro e a Rússia e a Itália; verificava pessoalmente o bom tratamento dos
prisioneiros nos campos, ajudava e sustentava como podia os soldados que voltavam do
fronte; sempre se recusou a tomar medidas de represália contra os civis dos países
inimigos que permaneceram no seu país.45
A abolição do duelo, uma prática muito difundida e difícil de extirpar, suscitoulhe
fortíssima oposição. “É preciso recordar que desde o princípio, pela recusa ao
duelo, o Servo de Deus, potencialmente enfrentou a perda da existência burguesa (tanto
do grau militar, como do título de nobreza), do habitual círculo social e, portanto, o
possível exílio. (...) Por causa de sua perseverante luta contra o duelo, que culminou
por fim na sua absoluta proibição, o Servo de Deus perdeu, de fato, consideração e
acatamento de uma parte do corpo oficial. No entanto, ele preferiu tomar sobre si este
dano, que não era de se subestimar especialmente em tempo de guerra, a tolerar que
seus oficiais continuassem neste pecado”.46 Nesta mesma ótica deve ser entendida a
41 Summ. test. p. 371, ad 18, Dr. Erich Thanner.
42 Summ. test. p. 466, ad 18, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg.
43 Summ. docc. p. 267.
44 Summ. test. p. 176, § 272, Barão Gustavo Grimm-Szepes Etelvar.
45 Summ. test. p. 636, § 821, Imperatriz Zita.
46 Summ. test. pp. 509-510, ad 38, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg.
abolição da pena de “atar”,47 isto é, de penas corporais que podiam ser infligidas aos
soldados, consideradas indignas do ser humano pelo Servo de Deus.
Durante os últimos tempos da guerra, a escassez de provisões se tornou sempre
mais drástica. A fome, a miséria e a morte mostravam-se ser os verdadeiros vencedores
do conflito.
O Servo de Deus fez de tudo para condividir e aliviar as dificuldades do seu
povo. Organizou cozinhas populares; empregou os cavalos da corte para a distribuição
de carvão em Viena; lutou desesperadamente contra a corrupção e a usura; deu e
distribuiu mais do que lhe permitiam os seus meios. Ele mesmo e sua família viviam em
base ao racionamento oficial de guerra.48 Proibiu o uso do pão branco em sua casa,
mandando-o distribuir entre os doentes e feridos, e aboliu toda espécie de requinte. Não
é de se admirar que seus oficiais declarassem que a comida era melhor no fronte do que
na casa do Servo de Deus!49
Evitou qualquer forma de nepotismo, obrigando seu irmão Max, que demoravase
de bom grado em Viena, a ir para o fronte e cumprir seu dever como qualquer outro
oficial.50
Proibiu a requisição das casas, por parte dos oficiais, nas localidades mais
próximas ao fronte, consentindo apenas o uso de hospedarias e albergues. Por isso, foi
chamado de “Patrono da defesa dos lares”.51
Carlos compreendeu também que para conseguir a tão desejada paz externa era
necessário colocar ordem na própria casa. Para realizar isso, inspirou suas medidas
sociais na Encíclica “Rerum Novarum”. É nesta direção que devem ser lembradas suas
iniciativas de instituir um Ministério da Previdência Social e outro para a Saúde
Pública; a idéia de transformar a monarquia em um Estado federativo, no qual cada
nacionalidade poderia desenvolver-se no seu próprio âmbito; o projeto de reforma
agrária para a Boêmia e a Hungria; a legislação em favor das classes trabalhistas, que
trouxe notáveis benefícios; a introdução do controle dos preços para tornar mais fácil a
vida dos menos abastados.
Estabeleceu que os grandes cargos se tornassem honorários, ou seja, não mais
remunerados, e que seus alojamentos não fossem mais decorados com luxo; aumentou
os estipêndios dos empregados da corte; os trabalhadores diaristas foram assumidos
estavelmente e os seus anos de diaristas foram contados para a aposentadoria.
Puniu com muita severidade todos aqueles que, abusando da própria posição,
tiravam benefícios pessoais dos negócios de Estado. O General Auffenberg, Ministro da
Guerra do Reich, foi exonerado do seu Comando e enviado a um júri de honra por ter
recebido das fábricas Skoda uma provisão pelo fornecimento de novos obuses.52 Proibiu
o Arquiduque Leopoldo Salvador, General de artilharia, de vender suas invenções à
própria artilharia e o constrangeu também à restituição de todos os lucros da patente. De
fato, julgava imoral que um rico Arquiduque recebesse um percentual de sua invenção,
cujo uso ordenava em todo a âmbito da artilharia austríaca.53 Mesma sorte coube a um
rico Arquiduque que fazia grandes negócios com a venda de legumes secos ao exército.
47 Summ. test. p. 521, § 702, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg. NT: Atar os punhos aos
tornozelos.
48 Summ. test. p. 307, ad 17, Dr. Erich Thanner.
49 Summ. test. p. 173-174, ad 17, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg.
50 Summ. test. p. 247, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
51 Summ. test. p. 635, § 818, Imperatriz Zita.
52 Summ. test. p. 189, § 293, Barão Gustavo Grimm-Szepes Etelvar.
53 Summ. test. p. 524, § 706, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg.
Foi-lhe consentido apenas o ganho normal de uma propriedade agrícola. O Servo de
Deus tinha horror de tirar proveito da fome do próximo.54
Elaborou novas leis para a proteção da juventude e contra a “literatura barata”;
impediu a formação de uma imprensa sob a direção do chefe maçônico Dr. Sieghart;
propôs ao episcopado, infelizmente sem sucesso, a ereção de igrejas provisórias nos
superpovoados bairros operários de Viena e a pregação de missões populares em toda a
monarquia.55
Em sua constante busca da paz e da justiça, no dia 2 de julho de 1917, concedeu
a anistia geral para remediar as múltiplas injustiças que se verificaram na aplicação das
penas por parte dos Tribunais Militares. Por exemplo: um camponês da Galícia foi
culpado de alta traição porque tinha rezado pelo Czar; uma bailarina tivera a mesma
sorte porque respondera um tanto desrespeitosamente a um oficial que a estava
molestando.56 Tal atitude, como fora oportunamente previsto pela esposa Zita, atraiu
contra o Servo de Deus hostilidades e calúnias. Contudo, bem consciente das
conseqüências, disse que não esperava gratidão, mas que lhe importava apenas o direito
e a conciliação dos povos. Bastava-lhe ter cumprido seu dever diante de Deus e de seu
próximo,57 pois o direito de mostrar indulgência – disse – é a mais bela prerrogativa da
Coroa.
Enquanto isso, a vida espiritual do Servo de Deus crescia e refinava-se, lutando,
todos os dias contra desilusões, derrotas e calúnias.
De fato, como muitas vezes ocorre com relação a um soberano reinante, também
contra o Servo de Deus foram lançadas baixas e infames calúnias, provenientes de
grupos e movimentos contrários a ele que, naquele momento, era o soberano mais
católico da Europa e o mais fiel à Igreja de Roma. Durante o Processo de beatificação, a
consistência de tais calúnias foi profundamente estudada e, aos 31 de outubro de 1977,
Dom Amato Pedro Frutaz, Subsecretário da Congregação para a Causa dos Santos,
declarava que “as calúnias circuladas com o intuito de ferir a honra do Imperador e
para desacreditá-lo junto ao povo causaram grande sofrimento ao Servo de Deus,
justamente porque sem fundamentos.
As mais graves são: as amantes, a embriaguez, a infelicidade matrimonial e,
portanto, a sua infidelidade conjugal. As ‘Memórias’ da Sra. Lauffer, uma
desventurada, agressiva e mentirosa prostituta, definida pelo Tribunal como ‘suspecta
et fide non digna’ (suspeita e não digna de fé), não são outra coisa senão um
amontoado de fatos e obscenidades privadas de qualquer fundamento (...) para realizar
o seu fim ganancioso de extorquir dinheiro.
O Tribunal Ordinário de Viena, por meio dos interrogatórios, (...) propostos a
testemunhas em condições de conhecer a vida pública e privada do Servo de Deus,
lançou luz sobre todos esses boatos acima mencionados e, ainda, recolheu informações
extremamente claras e convincentes. (...) Todas as calúnias imputadas ao Servo de
Deus mostram-se privadas de fundamento e em nítido contraste com o teor de vida
descrito por 71 testemunhas (...)”.58
As palavras do Evangelho de Mateus, neste caso, revelam-se mais oportunas do
que nunca: “Felizes sereis quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem
54 Summ. test. pp. 247-248, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
55 Summ. test. p. 403, ad 51, Padre Guilherme Schmidt.
56 Summ. test. p. 203, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
57 Summ. test. pp. 656-657, § 846, Imperatriz Zita.
58 Summ. test. add. pp. 125-126, Dom Amato Pedro Frutaz.
toda espécie de mal contra vós, por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque grande
será a vossa recompensa nos céus”.59
Mas, também no âmbito familiar, não faltaram as desilusões. Ele, contudo,
sempre buscou aplainar da melhor forma as discórdias, como no assunto relativo às
heranças que lhe foram deixadas e a seu irmão Max. Por amor à paz, isto não foi
resolvido até a morte do Imperador, embora o deixasse em seriíssimas restrições
econômicas.60 E, também, como no caso do legado que o seu tutor Francisco
Ferdinando fez-lhe assinar, sem seu conhecimento e ainda menor de idade, em favor de
seus filhos. Também aqui manteve-se fiel ao documento assinado, mesmo se
injustamente.61
A força para suportar tais provas provinha-lhe da oração incessante e da contínua
união com Deus, que sustentava e nutria com a participação diária da Santa Missa, a
adoração Eucarística e a devoção ao Sagrado Coração de Jesus. Confessava-se
regularmente a cada oito dias e era cuidadoso na santificação dos Domingos e na
observância dos dias de jejum. Gostava sobremaneira dos salmos e recitava
quotidianamente dois dentre eles: o “Miserere” e o salmo 90.62
Venerava de modo especial a Virgem Maria e a honrava rezando com freqüência
o terço, também em família; trazia com devoção o escapulário, segundo o uso da
confraria que acolheu também todos os seus filhos. Estes, justamente para honrar à
Maria, traziam também tal nome e, até a idade de três anos, só deviam usar roupas com
as cores de Nossa Senhora a que tinham sido consagrados.63
Pendurava uma medalha de Nossa Senhora no berço de seus filhos.64
Detinha-se, sozinho, muitas vezes em meditação diante das estações da Via
Sacra de sua capela privada.65
Antes de qualquer escolha importante, o Servo de Deus retirava-se para a capela,
sozinho, para poder ponderar a sua decisão diante do Santíssimo e “rezar a seu
respeito”, como costumava dizer.66
Tinha uma grande devoção para com o Espírito Santo e, durante as negociações
de paz, rezava diariamente, depois da Santa Missa, o Veni Creator. Manteve esta bela
prática também depois da obtenção da paz, julgando que o mundo tivesse necessidade,
mais do que nunca, da iluminação divina.67
Aos 2 de outubro de 1918, por ocasião da Primeira Comunhão de seu filho Otto,
consagrou toda a sua família ao Sagrado Coração de Jesus, incluindo nesta consagração
todas as nações da monarquia. O Ato de Consagração ao Sagrado Coração de Jesus era
recitado na capela da família todas as primeiras sextas-feiras do mês; a ladainha do
Coração de Jesus e o pequeno ofício do Coração de Jesus estavam entre suas orações
preferidas.68
A festa de Corpus Christi era sempre celebrada solenemente. É esta a razão pela
qual o Bispo Fischer-Colbry o definiu como o “Imperador Eucarístico”.69
59 Mt 5, 11-12
60 Summ. test. p. 232, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
61 Summ. test. p. 248, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
62 Summ. test. p. 567, § 748, Imperatriz Zita.
63 Summ. test. p. 148, § 226, Ana Francisca Maria Lamich.
64 Summ. test. p. 214, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
65 Summ. test. p. 511, ad 41, Barão Carlos Werkmann von Hohensalzburg.
66 Summ. test. p. 558, § 740, Imperatriz Zita.
67 Summ. test. p. 555, Imperatriz Zita.
68 Summ. test. p. 556, Imperatriz Zita.
69 Summ. test. p. 556, Imperatriz Zita.
Venerava de maneira especial a São Miguel, a quem elegeu como patrono do
Exército Imperial; ensinou seus filhos a rezarem quotidianamente ao próprio Anjo da
Guarda; era grande também sua devoção para com São José, como prova o fato de dar
aos seus filhos, além do nome próprio e o de Maria, o de José.
Teve grande solicitude pela beatificação do Padre Marcos de Aviano, e nutria
uma particular devoção pelo Irmão Conrado de Parzham, então já canonizado, trazendo
sempre consigo uma relíquia sua, mesmo durante a doença que o levou à morte.
Venerava também o santo pároco Maab Von Flieb no Tirol, além dos santos patronos
de seus países e de São Carlos Borromeu.70
Nunca iniciava uma refeição sem rezar antes e, ao meio-dia, em qualquer parte
que estivesse, rezava o Angelus.
Tinha particular apreço pelas indulgências e procurava lucrá-las. A indulgência
da Porciúncula, por exemplo, ele a lucrava com alegria e zelo ano após ano. Também
estimava muito o seu crucifixo, que tinha indulgência plenária in articulo mortis, e o
trazia sempre consigo.71
Sempre professou publicamente sua fé, sem escondê-la por razões de
conveniência ou oportunidade. Participava das Procissões de Corpus Christi, sempre
evocava a Deus em todos os seus escritos, rezava pelo fim do cisma da Boêmia,
considerava um grandíssimo escândalo o fato de que a Áustria não tivesse um grande
jornal católico próprio.
Sua retidão moral jamais cedia. É significativo o episódio contado por Elisabete
Carlota: “O governo alemão tinha idealizado um plano através do qual queria fazer a
Rússia e a Itália caírem, ou seja, tinha projetado deixar passar pelo seu território, num
vagão blindado, certos dirigentes comunistas que se encontravam no estrangeiro e
introduzi-los clandestinamente na Rússia e na Itália. Se não me engano, tratava-se de
Lenin e Trotzky para a Rússia; quem estivesse destinado para a Itália, não me recordo
mais. Estes deviam provocar a revolução no país, e depois, os frontes haveriam de cair
por si sós. O Servo de Deus recusou-se da maneira mais enérgica a isso, por duas
razões: principalmente porque o comunismo é deveras contra a religião; e depois,
também por prudência, compreendendo que uma ideologia política não fica detida nas
fronteiras. Esta atitude de meu pai foi útil na medida em que nenhum comunista foi
introduzido na Itália, nem a Áustria teve culpa de que a Alemanha tenha mandado, por
detrás de suas costas, Lenin para a Rússia”.72
Então, não é sem razão que Clemenceau afirmou: “O Imperador Carlos na
Áustria equivale a um Papa na Europa Central”.73
Seu respeito e obediência filial à Igreja de Cristo eram ímpares. Sempre pronto a
defender e a sustentar a Igreja, como um bom filho, acolheu com alegria a abolição do
direito de veto à eleição papal e renunciou para sempre ao direito de apresentar e
nomear Bispos em diversas Dioceses, tão só para fazer prevalecer os interesses do Papa,
mesmo às custas de suas prerrogativas imperiais.74 Devido ao seu amor pela Igreja de
Cristo, opôs-se à sua pessoa a potente maçonaria francesa, que possuía seus adeptos
também nos altos postos austríacos: Ministros, banqueiros, editores. A demissão do Dr.
Sieghart, conhecido e poderoso maçom, do cargo de Diretor do Instituto de Crédito
Fundiário causou reboliço também na França. A partir de então, sofreu repetidos e
70 Summ. test. p. 556-567, Imperatriz Zita.
71 Summ. test. p. 579, § 49.
72 Summ. test. pp. 221-222, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
73 Summ. test. p. 445, ad 53, Arquiduque Roberto da Áustria.
74 Summ. test. p. 244, § 363, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
violentos ataques por parte da maçonaria que, desde 1915 tinha seu plano para a
repartição e destruição do Império.75
Nunca permitiu que em sua presença alguém falasse mal do Papa ou do
Vaticano. Bento XV o chamava “seu filho predileto” e “foi por amor ao Papa – assim
relembra sua filha Elisabete Carlota – que ele reagiu imediatamente às tentativas de paz
do Santo Padre e foi o único Chefe de Estado a responder à mensagem de paz de 24 de
dezembro de 1916 do Santo Padre. Quando Bento XV ordenou que se rezasse uma
oração pela paz, ele logo a mandou imprimir. Tais folhetos foram colocados por toda
parte em sua capela privada. E, quando depois de um mês, o capelão deixou de rezar
esta oração, meu pai lhe pediu, por favor, que a continuasse a rezar. A princípio, o
clérigo não o quis, porque dizia que o Santo Padre a mandava rezar apenas para
poupar à Itália uma derrota por parte da Áustria. Diante da ulterior insistência de meu
pai, o Padre ficou mais indignado, mas a rezou assim mesmo. (...) Nos esforços pela
paz do Servo de Deus em união com o Santo Padre, ele encontrou grandes dificuldades
com o Núncio vienense de então, Dom Valfré de Bonzo, o qual compreendia mal muitas
coisas e as referia às avessas. Durante uma visita a Munich, meu pai conversou várias
horas com o Núncio Pacelli e, em seguida, pediu que se mandasse o Arcebispo Pacelli
como Núncio em Viena. Também comentou com minha mãe que, se ele estivesse em
Viena: ‘Nós dois juntos conseguiríamos a paz’”.76
A paz era o pedido premente de Bento XV; e a paz era a única ambição que
Carlos conhecia. Para conseguir este fim, percorreu todos os caminhos possíveis,
inclusive pela tentativa de uma paz separada com a França, sabotada pelas intrigas de
seu próprio Ministro das Relações Exteriores, o Conde Ottokar Czernin.
A partir do ponto de vista que nos interessa, isto é, o comportamento cristão do
Servo de Deus em qualquer circunstância, tentaremos explicar as motivações que
levaram à assinatura da falsa palavra de honra no “Caso Sixto” e que ficam
evidenciadas na Positio. O Dr. Friedrich Funder foi testemunha ocular direta dos
acontecimentos e relata uma visita ao seu ofício do ex-Ministro das Relações Exteriores
nos seguintes termos: “Nossa conversa, naturalmente, girou em torno do ponto crítico:
como teria sido possível ao Imperador apresentar um texto diferente e atenuado da
carta a Sixto, citada literalmente por Clemenceau, sobre a restituição da Alsácia-
Lorena, tornando, desta forma, o homem de Estado francês um inimigo não mais
reconciliável com a Áustria. O Imperador Carlos precisara afirmar por escrito, como
autêntico, o novo texto que Ottokar Czernin tinha recebido. Perguntava-se como isso
teria sido possível, considerando como evidente o fato de que o texto citado por
Clemenceau era o autêntico. E, então, vim saber da tremenda verdade.
Durante nossa conversa, Czernin se mostrara sempre mais excitado e pusera-se
de pé. ‘Tratava-se da minha vida e da honra de minha família’ – gritou. ‘Encontrei o
Imperador estirado sobre o divã, com uma bolsa sobre a cabeça. Estava exausto,
acabado. E eu lhe disse: Ou Vossa Alteza assina a declaração ou dou-me um tiro!
Então, ele assinou’. Mas como o senhor pôde fazer isso contra toda a verdade – gritei
aterrorizado e indignado. A conversa interrompeu-se repentinamente e não teve
seguimento”.77
O Relator Geral, Padre Ambrósio Esser, desenvolve assim a argumentação a tal
propósito: “(...) deixando de lado todas as possíveis reservas mentais, neste caso, o
Servo de Deus Carlos veio a se encontrar, verdadeiramente, diante de um insolúvel
‘casus complexus’, sofrendo, ademais, um ataque cardíaco. Como todos os bons
75 Summ. test. pp. 222-225, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
76 Summ. test. pp. 215-216, Arquiduques Elisabete Carlota.
77 Summ. test. p. 699, Imperatriz Zita.
católicos de então, ele acreditava que a alma de um suicida fosse diretamente para o
inferno. O Conde Czernin, na sua exaltação, era de fato capaz de realizar a ameaça de
suicídio. Se o tivesse cometido, o Imperador teria que se acusar por toda a sua vida de
ter causado a condenação de uma alma ao inferno e também teria sido acusado de ter
causado o ato desesperado de seu Ministro das Relações Exteriores. Sem dúvida, a
escolha de Czernin para Ministro foi a mais infeliz do jovem monarca. Contudo, este se
sentia obrigado a seguir os conselhos de seu tio assassinado. E não se podia prever que
Czernin haveria de se tornar o instrumento cego de Ludendorff, alma negra do Estado
Maior General alemão”.78
Nos seus esforços para conseguir a paz, o Servo de Deus também precisou
suportar ser definido como um fraco e covarde. Na verdade, as suas obstinadas
tentativas “foram também definidas como traição com relação ao aliado alemão que
conhecia apenas a ‘paz vitoriosa’”.79
E acabou que “seus nobres esforços naufragaram, em parte devido à
incapacidade, em parte devido à falta de consciência dos diplomatas, tanto de um lado
como de outro, de modo que até o radical da esquerda francesa, Anatole France, pôde
escrever: ‘O Imperador Carlos é o único homem decente, durante a guerra, a ocupar
um posto de direção, mas não foi escutado. Desejou sinceramente a paz, e por isso foi
desprezado por todo o mundo; perdeu-se uma esplêndida oportunidade’”.80
A derrota do Servo de Deus foi, pelo contrário, a vitória daqueles que, como
explica Francisco Fejtö, tinham “a obcessão de uma vitória total (...). No decorrer da
guerra – que se atolou mais de uma vez em pontos mortos, dos quais, tradicionalmente,
se saía com negociações e compromissos –, apresentou-se uma idéia nova: a da vitória
total, a qualquer custo. Não mais se tratava de constranger o inimigo a ceder, a recuar,
mas de infligir-lhe chagas incuráveis; não se tratava mais de humilhá-lo, mas de
destruí-lo. Este conceito da vitória total condenava, a priori, ao falimento qualquer
tentativa razoável de colocar fim, com um compromisso, a um massacre inútil. A guerra
mudou não só ‘quantitavamente’, mas também, para adotar um conceito hegeliano,
qualitativamente. Esta idéia não se originou apenas da exasperação dos líderes
militares ante a derrota ou paralisia de batalhas que esses julgavam decisivas.
Tampouco provinha dos Gabinetes diplomáticos e das Chancelarias. Parecia erguer-se
das profundezas populares. Tinha um aspecto quase que místico; era ideológica.
Consistia em demonizar o inimigo, fazer da guerra de poder uma guerra metafísica,
uma luta entre o Bem e o Mal, uma cruzada.”81
Podemos muito bem dizer com o salmsita no salmo 11,3: “Quando os próprios
fundamentos do universo se abalam, o que pode ainda o justo?”. Assim, apesar de
todas as tentativas de Carlos, a paz foi conseguida com a força das armas.
1918 foi o ano da capitulação. No Piave, em Marna, Amiens, Vittorio Veneto e
por toda parte, o destino da Alemanha e do Império Austro-húngaro estava marcado.
Wilson pronunciou seus “14 pontos” para a manutenção da paz mundial. A Romênia
assinou o tratado de paz com a Entente, a Bulgária se rendeu, a Checoslováquia e a
Polônia declararam sua independência, a Turquia assinou o armistício e o Kaiser
abdicou, permitindo o nascimento, no ano seguinte, da débil República de Weimar.
Neste momento dramático, o Imperador está sozinho, exposto a qualquer um que
tivesse querido matá-lo. No Palácio de Schönbrunn, não havia sequer as sentinelas
militares e apenas um grupo de jovens cadetes assumiu voluntariamente o serviço de
78 Relatio et vota dei Consultori storici, p. 83.
79 Summ. test. p. 144, ad 20, Ana Francisca Maria Lamich.
80 Summ. test. pp. 272-273, § 403, Hermano Büeler de Florin.
81 François Fejtö, Réquiem per un Impero defunto, Milano, 1990.
guarda.82 As tropas fiéis ainda estavam no fronte, de modo que, mesmo se tivesse
querido, não teria podido opor resistência aos tumultos das ruas que iam crescendo,
guiados por ‘homens políticos sem consciência”.83
Aos 11 de novembro de 1918, para evitar inúteis derramamentos de sangue e sob
a pressão de seus Ministros, assinou o Manifesto em que se lê: “Sempre invadido de um
imutável amor por todos os meus povos, não quero ser obstáculo ao seu livre
progresso. Reconheço a priori aquilo que a Áustria alemã decidir a respeito da escolha
de sua futura forma de Estado. O povo assumiu o próprio governo por meio de seus
representantes. Renuncio a qualquer participação no governo do Estado. Ao mesmo
tempo, exonero de seu mandato o meu governo austríaco”.84
O Conde Otto Czernin depõe desta forma: “No desmoronamento da monarquia,
o Servo de Deus se comportou admiravelmente, como em todas as outras ocasiões. Não
renunciou ao trono, pois o seu ponto de vista era que o reino lhe tinha sido imposto por
graça de Deus como um dever, e que ele não podia subtrair-se a tal dever. Renunciou
temporariamente ao exercício temporal dos seus direitos soberanos, aceitando, porém,
como vontade divina tudo o que, então, lhe atingia. O único desejo do Servo de Deus
era evitar, também naquela situação, qualquer derramamento de sangue. Estava
compenetrado do princípio cristão do amor ao próximo para agir assim e não de outra
forma”.85
No dia seguinte, 12 de novembro de 1918, foi proclamada a República e a
queda da monarquia. Os bens sujeitos ao Erário da corte foram confiscados e, na mesma
tarde, Carlos, com toda a sua família, teve que deixar Viena rumo à sua casa de caça em
Eckartsau, mas, antes de deixar o Palácio de Schönbrunn, fez uma visita de despedida
ao Santíssimo.86 Enquanto isso, alastrava-se na Hungria a revolução e o Primeiro
Ministro Tisza foi assassinado pelos revolucionários.
Em Eckartsau, esperava-o um período difícil e humilhante. Tratado como um
prisioneiro comum, rigorosamente vigiado de dia e de noite por um Coronel inglês
(entre outras coisas, para evitar que a família dos Habsburgo sofresse a mesma sorte dos
Romanov na Rússia), observado pelos “Guardas Vermelhos” que muitas vezes
dificultavam os fornecimentos de víveres, Carlos cai doente até a primavera de 1919.87
Apesar desta situação, o Servo de Deus continuou, todas as tardes, a rezar o Te
Deum, e o fez cantar no dia 31 de dezembro de 1918, em ação de graças por tudo quanto
o ano que expirava tinha trazido. Propuseram-lhe omiti-lo. Ele, porém, respondeu que,
naquele ano, muitas graças tinham sido alcançadas, graças às quais devia agradecer.
Declarou que, naquele ano, o bom Deus tinha-lhe dado provas particulares de sua
bondade, melhor: que o tinha cumulado com tais provas. Também, se o ano parecia ter
sido muito duro, poderia muito bem ter se tornado ainda pior, e se da mão de Deus
recebemos com gratidão o bem, então, devemos receber, com a mesma gratidão, aquilo
que é penoso. Ademais, naquele ano, tinha-se terminado a terrível carnificina
internacional.88
Nunca se demonstrou inquieto ou alterado. Pelo contrário, mostrava-se contente
por finalmente ter mais tempo para dedicar-se à esposa e aos filhos.
82 Summ. test. p. 84, ad 26, Ana Hubalek Pohl.
83 Summ. test. p. 378, ad 26, Dr. Erich Thanner.
84 Summ. test. p. 581, Imperatriz Zita.
85 Summ. test. p. 358, § 530, Conde Otto Czernin-Chudenitz.
86 Summ. test. p. 542, ad 27, Imperatriz Zita.
87 Summ. test. pp. 490-491, §§ 673-674, Barão Carlos Werkmann von Hohensalburg; pp. 204-205, ad 27,
Arquiduquesa Elisabete Carlota.
88 Summ. test. pp. 602-603, § 784, Imperatriz Zita.
Neste período, os pedidos e as súplicas para que abdicasse multiplicaram-se, mas
nada valeu para fazê-lo desistir da decisão tomada. Quando seu irmão Max e outros três
Arquiduques foram ter com ele a fim de convencê-lo a evitar a confiscação dos bens da
família através da abdicação, o Servo de Deus respondeu somente que a coroa não era
para ser vendida por dinheiro.89
Vista a determinação do Servo de Deus a não abdicar, o governo austro-alemão
no poder o expulsa do país, depois de ter pedido e obtido da Suíça a disponibilidade de
concessão ao asilo.
Em 23 de março de 1919, a Família Imperial transfere-se para a Suíça e aos 3 de
abril de 1919, a Assembléia Nacional Austro-alemã decretou o exílio e o confisco dos
bens, também pessoais, do Servo de Deus e de sua família inteira.
Através de diversos testemunhos, fica claro que, durante o exílio suíço, mais de
uma vez, altos expoentes da maçonaria ofereceram ao Servo de Deus a possibilidade de
retomar, através de sua ajuda, o trono do qual, também por causa deles, ele tinha sido
deposto, com a condição de que admitisse leis mais liberais com relação ao matrimônio,
um sistema de escola livre e a admissão da maçonaria na Áustria.90 A resposta que o
Servo de Deus dava a tais propostas era verdadeiramente exemplar: “Aquilo que recebi
das mãos de Deus não posso aceitá-lo das mãos do demônio”.91
“Como Rei Apostólico da Hungria, o Servo de Deus sentiu-se sempre obrigado
a fazer de tudo para recolocar este país novamente em pé. Naquele tempo, moveu-o
particularmente o desejo do Santo Padre Bento XV que lhe pedira para retornar à
Hungria e aí levantar um baluarte de proteção para a Santa Igreja”.92 Estas palavras de
Zita, confirmadas também pelo último Chefe de Gabinete, o húngaro Dr. Alàdar di
Boroviczény,93 permitem compreender a razão profunda que levou o Servo de Deus às
duas tentativas falidas de restauração na Hungria. A primeira, realizada em 24 de março
de 1921, faliu depois de doze dias, com a repentina partida do Rei para impedir a guerra
civil iminente e a intervenção de potências estrangeiras.
De volta à Suíça, é submetido a medidas mais severas de vigilância e à
obrigação de comunicar às autoridades locais sua eventual partida do país. Assim foi
estabelecido com o intento de evitar uma nova tentativa de restauração na Hungria, onde
Carlos era ainda oficialmente reconhecido como Rei, inclusive pelo “lugar-tenente”
Almirante Horthy, então, Regente.
Também no tempo do exílio, não deixou de visitar com grande amor os lugares
de peregrinação mariana. Em Maria-Einsiedeln edificou os monges com a sua devoção
à imagem milagrosa e, apesar das limitações financeiras, deixou como dom um precioso
anel com uma rara pérola negra, o qual, posteriormente, foi incrustado na coroa da
Virgem.94
A Comunhão diária era para ele um momento irrenunciável. Se não lhe fosse
possível recebê-la em casa, então, buscava uma igreja ao longo do seu caminho.
Recitava, todos os dias, junto com seus filhos, o Angelus e sofreu muito quando,
encontrando-se no Cantão suíço de Vaud, protestante, não podia escutar os sinos
repicarem em lembrança da Anunciação.95
89 Summ. test. p. 204, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
90 Summ. test. p. 133, § 202, Irmã Josefa do Pobre Menino Jesus.
91 Summ. test. p. 145, § 221, Ana Francisca Lamich.
92 Summ. test. p. 545, § 730, Imperatriz Zita.
93 Summ. test. pp. 397-398, § 572, Dr. Alàdar de Boroviczény.
94 Summ. test. pp. 444-445, Emília Gehrig.
95 Summ. test. p. 555, Imperatriz Zita.
Impelido novamente por alguns políticos internacionais – que pressagiavam um
fortalecimento da Alemanha às custas do desfeito Império Austro-húngaro –, pela
catastrófica situação interna da própria Hungria, pela obrigação que, como Rei, Carlos
deveria passar um certo tempo, cada ano, em solo do Reino de Santo Estêvão sob pena
de deposição e, sobretudo, levado pelas sempre mais crescentes preocupações do Santo
Padre, que temia agora uma sovietização da Europa,96 Carlos empreendeu, em outubro
de 1921, a segunda e última, também falida, tentativa de restauração na Hungria. A
respeito da conveniência e oportunidade de tal tentativa, que também custou muito em
termos de vidas humanas, um dos consultores históricos afirma: “O Servo de Deus
estava na Suíça a contragosto; na verdade, apenas suportava o exílio. O seu reino
encontrava-se numa situação caótica; sentia que era chegada a última hora do seu
mandato – para ele, um encargo recebido de Deus e aceito com juramento e que muitos
esperavam que ele levasse a cabo. Havia razões preponderantes de ordem moral para
que ele agisse assim. Depois, naturalmente, fica a esclarecer também se o plano foi
sábio. As declarações (mesmo dos peritos militares) concordam em afirmar que foi
escolhido o último momento possível”.97
Também durante a sua viagem de trem rumo à Hungria, o Servo de Deus não
renunciou ao conforto da Santa Comunhão e pediu ao reverendo Padre Davi que
celebrasse a Missa junto aos trilhos da ferrovia, em Bia-Torbagy, e, no dia seguinte,
numa garagem junto à estação.98
Quatro dias após o malogro da segunda tentativa de restauração, o Servo de
Deus foi preso e conduzido como prisioneiro para a Abadia de Tihany, separado de seu
séqüito e posto debaixo de rigorosa guarda. “Aí, foi-lhe recusado participar da Santa
Missa e receber a Santa Comunhão até mesmo num dia de festa solene. Este tratamento
do Servo de Deus por parte de Horthy foi condenado da maneira mais áspera possível
até pelos ambientes antimonárquicos (...)”.99 Constantemente solicitado a abdicar,
respondeu sempre com uma forte recusa, a ponto de Horthy pensar em recorrer ao
Cardeal Primaz da Hungria, o Arcebispo João Csernoch, para obter aquela abdicação
voluntária que teria tornado menos absurda e ilegal a destituição do Rei. Mas, o
Cardeal, fiel ao Rei, respondeu: “Eu, que coroei o Rei, não posso aceitar uma ordem de
pedir-lhe para renunciar ao trono”.100
O encontro com o Cardeal se deu em 20 de outubro de 1921. O Cardeal ficou
muito impressionado com a audiência que teve junto ao casal real. O Rei estava com os
cabelos grisalhos; a Rainha tinha emagrecido, estava cansada e sem ânimo. Ambos
falavam com serenidade e de maneira muito inteligente. Sua fé era inabalável. Estavam
profundamente convictos da necessidade de sua causa”.101
O Primaz relatou à conferência episcopal que tinha exposto claramente ao Rei a
difícil situação e a ameaça de uma intervenção militar por parte das potências
estrangeiras.
O Rei teria declarado considerar, segundo seu juramento sobre a coroa, seu
grave dever defender a Coroa de Santo Estêvão. Por isso, estava pronto a acolher as
pesadas provas do destino e a “subir, conscientemente, com fé e determinação o Monte
Calvário”. Ele declarou ao Cardeal que não tinha, absolutamente, abdicado. O Primaz
96 Summ. docc. p. 1079.
97 Relatio et vota Consultori storici, p. 46.
98 Summ. test. p. 560, Imperatriz Zita.
99 Summ. test. p. 179, Barão Gustavo Grimm-Szepes Etelvar.
100 Summ. docc. pp. 420-421.
101 Summ. docc. pp. 420-421.
concordou, pois a abdicação espontânea por parte do Rei teria sido pior que a sua
violenta destronização”.102
Neste meio-tempo, preocupou-se em escrever para seus filhos, transferidos para
o Castelo de Wartegg, para não perderem a esperança e para rezarem ainda mais
insistentemente diante do tabernáculo, junto do qual estariam logo todos reunidos.103
Depois de alguns dias por demais humilhantes e duros na Abadia de Tihany, a 1º
de novembro de 1921, o casal imperial foi entregue aos ingleses e conduzido, pelo
Danúbio, numa embarcação rumo a uma meta desconhecida. Mas, antes de partir, o
Servo de Deus recebeu do Núncio a bênção apostólica e também as palavras
encorajadoras que o Papa quis que chegassem a ele. O Comandante deste navio
monitor, falando do comportamento do Servo de Deus nesta circunstância, disse:
“Mostrou-se um católico piedoso, e foi o maior exemplo de coragem e dignidade diante
da adversidade que tive a graça de ver”.104
Através do testemunho de Zita, podemos seguir a narrativa daquela tão penosa
viagem para o exílio: “Depois de muitas mudanças de embarcações, passando por
Constantinopla, Dardanelos e as ilhas gregas rumo à costa africana, dirigimo-nos para
Gibraltar, onde soubemos o destino de nossa viagem. A maneira como o pequeno navio
estava arrumado era muito precária, embora os oficiais em serviço fizessem de tudo
para aliviar nossa estadia. (...) O Servo de Deus ressentiu muito dolorosamente não ter
nenhuma possibilidade de assistir a uma Santa Missa e de receber a Santa Comunhão.
Ele o pediu repetidas vezes, mas, até Gibraltar, todas as suas instâncias foram em vão.
(...) Durante a parada em Gibraltar, foi permitido que um sacerdote viesse a bordo
para celebrar a Santa Missa. O Servo de Deus ajudou como coroinha e ambos
comungamos. Naquela ocasião, também nos confessamos e pedimos água benta.
Depois desta breve parada, a viagem prosseguiu rumo à Ilha da Madeira, onde
chegamos no dia 19 de novembro de 1921”.105
Os cinco últimos meses de vida que o Servo de Deus passou no exílio, na
distante ilha do Atlântico, foram para ele como um cadinho no qual se purifica o ouro
fino. Sofrimentos, humilhações, desilusões, mortificações, privações e pobreza foram o
seu pão quotidiano. E, contudo, ninguém ouviu sair de sua boca uma única lamentação
ou palavra de condenação para com seus perseguidores, mas, voltado sempre mais para
Deus que lhe havia escolhido um caminho diferente, aceitou subir com Cristo o Monte
Calvário, para abraçar sua cruz.
Quando de sua chegada na Ilha da Madeira, o Servo de Deus encontrou-se, de
fato, diante do nada. Não tinha dinheiro, não tinha notícias da Europa, estava separado
de seus filhos, mas a primeira coisa que quis foi que, na pequena casa em que se aloja
temporariamente, fosse preparada uma capela doméstica para a celebração diária da
Eucaristia.
Estava totalmente resignado à vontade de Deus, e bem “antes da doença que o
levou à morte, compreendeu que Deus lhe pedia o sacrifício da vida. Fez, com fortaleza
e boa vontade de ânimo, tal sacrifício, pois era Deus quem o pedia. Ofereceu até o
sacrifício de sua vida a Deus para o bem da Igreja e das almas imortais”.106
Quando, depois de alguns meses conseguiu ter consigo toda a família, outra
terrível notícia abateu-se sobre ele. As jóias pessoais, com a renda de cuja venda
pretendia viver, foram roubadas e, portanto, impossibilitado de pagar o aluguel da casa
102 Summ. docc. pp. 421-422.
103 Summ. test. p. 146, Ana Francisca Maria Lamich.
104 Summ. docc. pp. 166-167.
105 Summ. test. p. 552-553, Imperatriz Zita.
106 Summ. test. pp. 553-554, § 733, Imperatriz Zita.
até então ocupada em Funchal, precisou aceitar a oferta de um rico português que
colocou à disposição da família sua casa de verão no Monte: três quartos muito
precários.
Aos 19 de fevereiro, mudaram-se para a nova residência, que devido às suas
características e à sua posição, era, definitivamente, imprópria para aquele período frio e
cheio de névoas. Era quase que impossível aquecê-la, e viver aí era nocivo para a saúde.
As testemunhas contam que, por causa da umidade, a água corria das paredes107 e que,
quando se abria a janela, penetravam no cômodo densos vapores de neblina.108
Na mesma tarde do dia da chegada, o Servo de Deus reuniu toda a família para a
oração em volta da lareira acesa da sala de jantar e pediu ao Padre Zsámboki que
benzesse a casa “a fim de que, aqui, entrem também a paz e a alegria”.109
Uma vez que também isso fazia parte dos planos de Deus, o Servo de Deus
aceitou tudo de bom grado, confortado pela fé, pela companhia de todos os seus filhos e
da amada esposa – que já esperava a última filha – e, ainda, pela alegria de ter próximo
da casa um Santuário mariano, o de Nossa Senhora do Monte, onde dentro de poucos
meses seria sepultado.
Amável e respeitoso como sempre, passava o dia muito feliz com toda a família,
dedicando grande parte do seu tempo à educação e à formação dos filhos, em especial
dos dois mais velhos; enfim livre para gozar plenamente das alegrias da paternidade,
sem nenhuma restrição de tempo.
Como já fizera quando eram bem pequenos, instruiu-os sobre o catecismo, sobre
a História Sagrada e a vida do Redentor. Fazia de tudo para dirigir suas almas e suas
mentes para Deus.110 Tinha o belo costume de levar os filhos, mesmo ainda muito
pequenos, para a capela, a fim de apresentá-los ao Senhor e, juntando-lhes as mãos,
ensinava-os a rezar.111 Além disso, abençoava-os, desde o primeiro instante de suas
vidas, com água benta e repetia este gesto, todas as noites, antes de se porem na cama
para dormir, colocando-os sob a proteção de seus Anjos da Guarda.112
A família não tinha nem cozinheiros, nem criados [no início do exilo], e também
não tinha dinheiro, de modo que o Bispo da Ilha da Madeira ofereceu-se para pagar
algumas despesas, mas o Servo de Deus recusou a oferta, agradecendo-o.113
Assim o recorda, naquele tempo, o Cônego Mons. Antônio Homem de Gouveia:
“No trato quotidiano com Sua Majestade, admirei sua fé extraordinária, prática,
subordinando todos os seus atos à vontade de Deus, suportando com a máxima
resignação todos os reveses e contrariedades, jamais tendo uma única palavra contra
os seus inimigos, procurando, pelo contrário, desculpá-los, dizendo que eram
instrumentos da Divina Providência. Passava grande parte da noite na presença do
Santíssimo Sacramento, conservado no oratório de sua casa e, por mais urgentes que
fossem, jamais resolvia assuntos importantes sem antes estar junto ao Santíssimo
Sacramento. (...) Participava da Santa Missa com uma devoção verdadeiramente
impressionante; recebia quotidianamente a Santa Comunhão, edificando todos os
circunstantes pela sua eminente piedade e fé, manifestada até nos mais simples
movimentos. (...) Em casa, era de extrema afabilidade com todos: esposa, príncipes,
criados, não se ouvindo uma só palavra em voz alta, que manifestasse irritação ou falta
107 Summ. test. pp. 106-107, ad 35, Alfredo Kiesewetter.
108 Summ. test. p. 52, Arquiduquesa Elisabete Carlota.
109 Summ. docc. pp. 84-85, Duquesa Vitória Mensdorff Pouilly, “Storia della Malattia”.
110 Summ. test. p. 585, Imperatriz Zita.
111 Summ. test. p. 586, Imperatriz Zita.
112 Summ. test. p. 587, Imperatriz Zita; p. 807, ad 43, Padre Pál Zsámboki.
113 Summ. test. p. 806, Padre Pál Zsámboki.
de paciência. Com que alegria, por exemplo, recebeu a notícia do bom êxito da
operação de seu filho na Suíça! Correu, solícito, mais de um quilômetro de distância,
debaixo de uma chuva torrencial, para transmitir-me a notícia, exclamando: ‘uma
grande preocupação a menos em minha vida, e quanto agradeço a Deus!’”.114
Também o Bispo de Funchal disse que a estadia do Servo de Deus na Ilha da
Madeira correspondia à graça de uma pregação, pelo exemplo que dava sobretudo às
classes mais abonadas.115
Mas, mediante o seu comportamento, ficava claro que alguma coisa nele tinha-se
mudado profundamente. A sua íntima união com Deus se tornara tão forte, a ponto de
ser quase que palpável. O seu recolhimento durante a Missa tinha se tornado até mesmo
estático; naqueles momentos, todo o mundo externo desaparecia, tanto que não se
conseguia chamar sua atenção nem tocando-o, nem puxando-o fortemente, como teve
ocasião de constatar várias vezes a sua esposa Zita116 e os habitantes da ilha, que
ficaram edificados com o seu comportamento.
Um dia, fixando o olhar no Santuário de Nossa Senhora do Monte, disse à sua
esposa: “Não gostaria de morrer aqui”, mas, logo em seguida, acrescentou com grande
resolução: “O bom Deus fará aquilo que quiser”.117
Tinha compreendido claramente que Deus lhe pedia um sacrifício extremo para
a salvação dos seus povos: o sacrifício da própria vida.
Estava convencido de “que a oração do pai penetra através das nuvens. Parte
de meus filhos118 renegou a fé, outros correm o risco de condividir a mesma sorte.
Assim, devo lutar continuamente diante de Deus, para reconduzir uns e preservar
outros da mesma desgraça”.119
Agora, para ele, toda renúncia era possível, por amor a Deus, mesmo aquela de
sua família porque – respondeu à sua esposa, sempre mais assustada – “Deus deu-me a
graça de que, sobre a terra, não exista mais nada que eu não esteja pronto a sacrificar
por seu amor, para o bem da Santa Igreja” e, à pergunta se entendia a Igreja na pátria,
respondeu: “não posso mais separar pátria e Igreja”.120
A última cerimônia pública da qual o Imperador participou junto com seus filhos
mais velhos foi a bênção do relógio da torre da Catedral, do qual foi padrinho.121 Foi
calorosamente acolhido pela população de Funchal, a qual tinha conquistado na sua
breve estadia.
No dia 9 de março, inicia-se a subida do Monte Calvário do Servo de Deus que
culminará em 1º de abril, quando Carlos, Imperador da Áustria e Rei da Hungria,
entregará sua bela alma ao Pai, certo de receber dele “o prêmio da vida eterna, onde
poderá gozar da visão beatífica e descansar, enfim, no Coração de seu Mestre, dentro
daquele Coração que sempre foi o seu refúgio, a sua segurança, a sua esperança
absoluta.122
Aquilo que parecia uma banal e inócua gripe revelou-se uma devastadora
pneumonia. Mas, nos 22 dias de sua fatal doença, “nunca manifestou um movimento de
114 Summ. test. pp. 897-898, § 115, Monsenhor Antônio Homem de Gouveia, Cônego da Catedral de
Funchal.
115 Summ. test. p. 902, S. Excia. Revma. Dom Antônio Manuel Pereira Ribeiro, Bispo de Funchal.
116 Summ. test. pp. 616-617, Imperatriz Zita.
117 Summ. test. p. 581, Imperatriz Zita.
118 NT: Aqui, o Imperador está se referindo ao seu papel de monarca como um pai para seus povos, não
aos seus filhos com Zita.
119 Summ. test. p. 580, Imperatriz Zita.
120 Summ. test. p. 582, Imperatriz Zita.
121 Summ. test. p. 122, Duque Maximiliano von Hohenberg.
122 Summ. test. p. 872, Madre Maria Antônia de Bourbon-Parma.
impaciência, nunca se lamentou, apesar da terrível opressão para respirar, da tosse
atormentadora, da sede ardente, da fraqueza paralisante, apesar dos dolorosos
tratamentos, das inúmeras injeções e de duas doloridas úlceras”.123
No decorrer de toda a doença, o Servo de Deus rezava ininterruptamente e,
quando a voz lhe faltava, então continuava sua oração interior. Sua única preocupação
era não cansar sua esposa e aqueles que estavam cuidando dele. Ademais, esta
característica o tinha acompanhado todos os dias de sua vida, também quando
Imperador.
Quando compreendeu que seu fim estava iminente, quis conversar com sua
esposa Zita sobre a futura educação dos filhos, com particular atenção à instrução
religiosa, especialmente do primogênito. Para a escolha do tutor varão, Zita recebeu
diretivas específicas: “Devido às rivalidades nacionais dos grupos monarquistas,
poderia surgir dificuldade para a nomeação. O Servo de Deus deu-me a ordem
explícita de escolher como tutor um estrangeiro (...) que oferecesse garantia para uma
educação perfeitamente católica e para inflamar a alma juvenil com os ideais católicos,
mesmo se isso significasse dano na formação política”.124
Tão logo a população soube da doença do “bom Rei Carlos”, começou a rezar e
ofereceu a procissão anual com Cristo Redentor como rogatio para a sua pronta
recuperação. Também os foguetes, que normalmente eram soltos em tal ocasião, foram
suspensos para não perturbar o repouso do enfermo.125
Naqueles prolongados dias, o seu maior desejo era o de poder assistir à Santa
Missa e receber a Comunhão, mas a errada concepção de que os remédios quebravam o
jejum eucarístico, constrangeram-no a “sacrificar o mais terno desejo de seu
coração”,126 até que o reverendo Padre Zsámboki, seu último capelão, persuadiu-o,
explicando-lhe paulatinamente repetidas vezes, que não era necessário, para um homem
assim doente, observar o jejum eucarístico.127 A partir daquele dia, ficou felicíssimo por
poder receber a Comunhão todos os dias, até a sua morte.
O agravar-se da doença, os freqüentes colapsos, a ineficácia dos dolorosíssimos
tratamentos, levaram a pressagiar o aproximar-se do funesto acontecimento. Desta
forma, a Arquiduquesa Maria Teresa, avó do Servo de Deus, aconselhou-o a receber a
Extrema-Unção, mas “ele, embora se confessasse regularmente a cada oito dias, quis
fazê-lo novamente, perdoando a todos aqueles que trabalharam contra si e oferecendo
suas orações e sofrimentos pelos seus perseguidores”.128
Quis também que na Extrema-Unção estivesse presente seu primogênito Otto,
para que “lhe ficasse uma lembrança e um exemplo para a vida, a fim de que também
ele saiba, um dia, o que deve fazer neste caso como verdadeiro católico e
Imperador”.129
Pediu que lhe fossem lidas as orações e as cerimônias do ritual de modo a
preparar-se com maior consciência. “O enfermo recebeu a Extrema-Unção com grande
devoção, estendeu ele mesmo as mãos para a unção e rezava, também ele, as orações
do sacerdote. Para ele, o mundo externo tinha desaparecido. Depois da Extrema-
Unção, dei-lhe a bênção do Santo Padre, de quem sempre fora um filho fiel”. 130 Assim
recorda o Padre Zsámboki.
123 Summ. docc. p. 86, Ana Hubalek Pohl.
124 Summ. test. p. 586, Imperatriz Zita.
125 Summ. docc. p. 91, Ana Hubalek Pohl.
126 Summ. docc. p. 123, Duque Maximiliano von Hohenberg.
127 Summ. test. p. 817, Padre Pál Zsámboki.
128 Summ. docc. pp. 93-94, Ana Hubalek Pohl.
129 Summ. docc. pp. 93-94, Ana Hubalek Pohl.
130 Summ. docc. p. 125, Duque Maximiliano von Hohenberg.
Durante a última noite de sua vida terrena, sofreu muito, mas ofereceu seus
sofrimentos para Cristo: “Preciso sofrer tanto assim para que meus povos possam se
unir novamente”. “Naquela noite atormentava-o uma grande sede, mas era preciso
adivinhar o que ele desejava. Muitas vezes, preferia ficar deitado por horas numa
posição mais incômoda a exprimir uma queixa ou manifestar um desejo. Por cada
serviço que lhe era prestado, agradecia com comovente cordialidade”.131 Ao
sofrimento físico, unia-se o moral: a preocupação pelo futuro da esposa e dos filhos, da
sua pátria, a distância dos seus fiéis... Mas, encontrava consolação para suas penas no
Sagrado Coração de Jesus. “Se não fosse isso – disse –, seria impossível suportar esses
sofrimentos”.132
No dia de sua morte, depois de ter recebido a Santa Comunhão, permaneceu
completamente recolhido em si mesmo, murmurando jaculatórias, dentre as quais
“Jesus, em ti eu vivo; Jesus, em ti eu morro” era a mais freqüente. O Padre Zsámboki
deu-se conta de que ele “olhava ardentemente a píxide, e foi por isso que ficou de pé,
segurando o Santíssimo, quase diante do rosto do moribundo”.133 Após algum tempo,
pediu insistentemente para receber o Viático, e, depois de tê-lo recebido, “o Imperador
disse com grande fervor: Nos braços do Redentor... você e eu e os nossos amados
filhos...”. Em seguida, recitou o ato de contrição perfeita e recomendou ao Senhor cada
um de seus filhos, pedindo para que os preservasse no corpo e na alma. ‘Deixai-os
antes morrer que cometer um pecado mortal. Assim seja’”.134 E beijou repetidas vezes a
imagem do Sagrado Coração de Jesus que lhe foi aproximada dos lábios.
Depois a situação degenerou rapidamente. Os médicos bombearam oxigênio
diretamente nos seus pulmões, mas inutilmente. “Depois, ouviu-se ainda com voz muito
suave: ‘Jesus, meu Jesus... Sim, meu Jesus, como vós o quereis... Jesus!’ Estas frases
soavam como fragmentos de um diálogo que ele mantinha com seu Salvador. O mundo
já não mais existia para ele. (...) Os lábios murmuravam orações; o olhar tornou-se
distante, como se já olhasse para um outro mundo. Apesar de todos os sofrimentos, sua
expressão era tão serena e doce, como nunca se viu em Sua Majestade sequer nos
melhores dias. (...) Ainda duas, três respirações e um leve suspiro... e o nobre coração
cessou de bater.
Embora profundamente comovido com a morte de Sua Majestade – dirá o Padre
Zsámboki –, estava muito tranqüilo sobre a sorte do defunto, como nunca estive em
outros casos”.135
O seu desapego aos bens terrenos era tão radical e seu guarda-roupa de tal modo
exíguo, que foi preciso pedir de volta um casaco que, algum tempo atrás, o Rei tinha
dado a um de seus criados, para que fosse sepultado com ele.136
À notícia da morte do Imperador, o povo do lugar acorreu em massa e, por
horas, passaram ao lado de seu esquife na capela preparada em casa, tocando aí terços e
objetos de piedade em sinal de devoção.137 Aquele homem simples, humilde e cordial,
cheio de cuidados e atenções para com seu próximo, capaz de estabelecer com os ricos e
com os pobres um verdadeiro relacionamento humano, tinha conquistado o coração dos
habitantes da ilha em apenas cinco meses, sem o esplendor do cetro e da coroa. Eles não
choravam um último Imperador, mas o bom Carlos, que na tribulação do exílio, tanto
131 Summ. docc. p. 126, Duque Maximiliano von Hohenberg.
132 Summ. docc. p. 127, Ana Tachezy.
133 Summ. docc. p. 127, Ana Tachezy.
134 Summ. docc. p. 128, Ana Tachezy.
135 Summ. docc. p. 129, Ana Tachezy.
136 Summ. test. pp. 809-810, Padre Pál Zsámboki.
137 Summ. test. p. 823, Padre Pál Zsámboki.
soubera edificá-los com seu comportamento profundamente humano e cristão. A este
homem, enamorado de Jesus, os habitantes de Funchal tributavam a honra e o afeto.
De seu funeral participaram cerca de 30.000 pessoas; o comércio permaneceu
fechado. O Bispo e os Cônegos de Funchal, junto a outros sacerdotes que celebraram o
seu funeral, falaram dele como de um santo, e o seu corpo foi sepultado na bela igreja
de Nossa Senhora do Monte.138
Mas, se com tal morte encerrava-se a vida religiosa terrena do Imperador e Rei
Carlos de Habsburgo, outra bem mais importante se iniciava: aquela nos braços de seu
Redentor, o doador daquela paz que tanto desejou em sua vida. É Jesus que levantou seu
humilde servo do pó do exílio para a glória dos altares.
138 Summ. test. pp. 823-824, Padre Pál Zsámboki.


Dificuldades em aceitar a sua beatificação

CARLOS D’ÁUSTRIA. QUEM TEM MEDO DO BEATO?
Por Rafael Vitola Brodbeck

Pressionado por Napoleão, o Imperador Francisco II de Habsburgo abdicou do trono do Sacro Império Romano Germânico, o que fez surgir os Estados alemães setentrionais independentes, logo reagrupados na Confederação do Reno e, mais tarde, no Império Alemão, o II Reich do Kaiser e de Bismarck. A Áustria, terra natal da Casa de Habsburgo, converteu-se, com o apoio do sul da Alemanha e das possessões italianas e balcânicas do antigo Sacro Império, na sucessora deste. O novel Império Austríaco erigia-se em continuador da história e das tradições daquele que o laicismo napoleônico pretendia destruir.

Como do Império de Carlos Magno broto o de Otão I – governado, a partir de 1438, pelos austríacos Habsburgo –, do último, fragmentado, nasceu o que viria a encarnar, como os precedentes, os valores cristãos e humanistas, e, apesar dos percalços, dos absolutismos, e dos erros comuns a qualquer agrupamento social, o passado de glórias medievais. O Sacro Império e o Império Austríaco, ambos sob os Habsburgo, seriam símbolos da ordem celeste no campo secular.

Exatamente por isso, as mesmas forças revolucionárias – Napoleão foi o responsável pela internacionalização do laicismo francês de 1789 – que destruíram o Sacro Império, mancomunaram-se, finda a I Grande Guerra, para a supressão do Império Austríaco, que lhe tomou o lugar. O ódio à Áustria tradicional era herdeiro da aversão ao I Reich inaugurado por Otão. Na realidade, o combate mais profundo se travava contra a Fé Católica, protegida primeiro pelo Sacro Império, depois, com a queda deste, pelo Austríaco. Aproveitaram-se os laicistas das culpas do governo (não do Estado) contra as minorias eslavas para decretar o fim de uma dinastia.

Ressaltando o papel do último Imperador da Áustria, João Paulo II o beatificou em 2004. Carlos I de Habsburgo, católico fidelíssimo ao Papa, de vigorosa vida de oração e senso de apostolado, não só cultivou heroicamente as virtudes em um tempo dos mais confusos e decisivos para a Cristandade – em que ruíram, além do católico Império Austríaco, o protestante Império Alemão (sucessor da Alemanha desunida por ocasião da queda do Sacro Império), e o ortodoxo Império Russo dos czares –, como se impôs contra os desmandos e abusos de seus ministros. Estes, interessados em continuar a aliança com a Alemanha e a guerra contra o restante do Ocidente para alargar seu sufocante despotismo sobre a Europa, isolaram Carlos, seu monarca, por influência de Bento XV, Papa da época, desejava cessar os combates. Percebeu o Imperador que os motivos da luta não eram justos e sua consciência cristã, formada aos pés do Santíssimo Sacramento, tencionou, de um modo que, ao mesmo, não sacrificasse sua soberania e fosse o mais prudente possível, acabar com a I Guerra Mundial. Na prática, os opositores, que ocupavam o governo de seu próprio país, o apeariam do trono, aliando-se aos liberais, que não toleravam uma Áustria sacral, pujante e militantemente católica. O fim do Império dos Habsburgo tornou-se, assim, um duro golpe nos direitos da Igreja e da paz, e um decisivo passo para, abatida a fiel casa dinástica, popularizar-se a cartilha iluminista na Europa do pós-guerra.

Os que forçaram a queda do Sacro Império e explodiram a Áustria monárquica são hoje os adversários da futura canonização de Carlos I, inventando legendas negras e atribuindo-lhe a pecha de belicista, autoritário e culpado pela deflagração mundial. Nada mais equivocado – é o que afirmam historiadores sérios e descomprometidos com as ideologias da moda, como Giuseppe Dalla Torre, reitor da Universidade Maria Ssma. Assunta, de Roma, que atribui à opinião pública anticlerical a orquestração contra a santidade do Imperador: “uma opinião pública”, acrescenta, “que foi substancialmente a mesma que impediu Carlos de levar a cabo seus projetos de paz do exterior e de reformas dentro do império austro-húngaro, e que o conduziu à perda do trono.” (Zenit, 7/1/05)

A oposição à beatificação de Carlos I é resultado do ódio à fé e à Europa profunda, da ação laicista e anticristã contra o Estado católico por excelência que era a Áustria, o qual é urgente que seja restaurado (pela evangelização da sociedade e recuperação dos valores próprios e naturais de seu povo). A santidade também pode ser alcançada pelos soberanos, e os Estados, se desejam representar, com legitimidade, as sociedades que neles se inserem, não devem se furtar à benéfica influência da fé popular. É a isso que os inimigos dos Habsburgo e do Beato Carlos, ontem como hoje, tanto se opõem.




Após a Beatificação


No dia 21 de Outubro, a Igreja celebra a memória litúrgica do Beato Carlos da Áustria. Este dia foi escolhido pela Igreja, por ter sido o dia do seu matrimónio. 
Coincidentemente, no dia 21 de Outubro de 2011 celebra-se o primeiro centenário desse acontecimento. Por essa mesma razão, foi escolhido esse dia para o lançamento público desta obra, « o Beato Carlos de Áustria os Habsburg na Madeira», que constitui «um ensaio biográfico, profusamente ilustrado, muito completo, estabelecendo, em linguagem simples, todo o percurso de vida do jovem imperador Carlos I da Áustria, até à sua beatificação em Roma, em Outubro de 2004.
O lançamento público será às 17 horas, seguindo-se uma concelebração eucarística. O livro será apresentada pelo cónego dr. Victor dos Reis Franco Gomes, que foi pároco do Monte aquando da beatificação, e conta com a presença do Arquiduque Simeão da Áustria, neto do Imperador que, para o efeito, se desloca à Madeira entre os dias 20 e 22 do corrente.
A obra está incluída na «Colecção Album» das Publicações DRAC, da Secretaria Regional da Educação e Cultura, que por sua vez, tem a responsabilidade da organização do lançamento público.
Sobre Carlos da Áustria, respigamos do Cardeal Saraiva Martins algumas notas. «Carlos da Áustria (1887-1922) foi Imperador da Áustria e rei da Hungria. Subiu ao trono depois de Francisco José, em 1916, durante a primeira grande guerra mundial. Homem de segura rectidão moral e sólida fé, procurou sempre o bem do seu povo e na sua acção de governo inspirou-se na Doutrina Social da Igreja. 
Fomentou a justiça, a paz e alimentou uma constante procura da santidade. Foi exemplar como cristão, marido, pai e soberano. Morreu no exílio na Ilha da Madeira (Portugal)». 
Os seus restos mortais repousam na igreja paroquial do Monte, ante os quais vai ser lançada publicamente a obra «Beato Carlos da Áustria os Habsburg na Madeira».

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O Imperador Carlos d´Áustria viveu apenas cinco meses entre nós, mas grangeou a simpatia e o respeito de todos os madeirenses que, ainda hoje, se orgulham da sua presença para além da morte, a partir igreja do Monte, onde está sepultado, e cujo túmulo é muito visitado por peregrinos de todo o mundo, principalmente desde a sua beatificação em 2004, em Roma. 
Para assinalar o 90.º aniversário do seu falecimento, a 1 de Abril de 2012, está prevista uma peregrinação à Madeira com cerca de uma centena de pesoas, entre descendentes e familiares . «Espero que isto seja uma maneira de lembrar a figura do Imperador, da sua vida e valores que defendeu», disse ao Jornal da Madeira o Duque de Bragança, D. Duarte Nuno, que ontem apresentou cumprimentos ao Bispo do Funchal.
Carlos d’ Áustria, referiu, «foi um dos últimos governantes cristãos da Europa; inclusivé, sofreu o exílio e a perseguição porque seguiu o pedido do Papa para acabar rapidamente com a Grande Guerra (1914-18), contrariando assim os planos de guerra de vários países».
Entretanto, o túmulo do Beato Carlos d’ Áustria deverá continuar na nossa Diocese, conforme decisão da família. «O arquiduque Otto (recentemente falecido) achava que devia ficar na Madeira, até pelo apoio e acolhimento dispensados pelos madeirenses»; além de que, «segundo a tradição da Igreja Católica, um santo é da terra onde morreu e onde nasceu para o céu», explicou D. Duarte Nuno.
Ainda em relação à peregrinação em 2012, a família do Imperador manifestou o desejo de ter a presença do Bispo do Funchal, mas tudo dependerá da agenda pastoral, pois, essa data coincide com as celebrações do Domingo de Ramos. D. António Carrilho destaca desde já a importância de «fazer memória viva de alguém que se distinguiu em termos de santidade e que, pela beatificação, é para todos nós referência, modelo e estímulo». 


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